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Veteranos de cursinho insistem nas carreiras difíceis

Por Agencia Estado
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Onze da manhã. Aula de Física. Matéria: transição de calor. Rodrigo vira para o lado e diz para a nova colega: "Você quer apostar quanto que agora ele vai perguntar: Quem sabe por que a mulher manda o homem deitar antes na cama quando está frio?" Dito e feito. O professor lança a questão. Não, Rodrigo não não tem o dom de adivinhar o que as pessoas vão fazer. Ele é um veterano de cursinho e já sabe de cor todas as piadas, músicas e outras artimanhas usadas pelos professores. Rodrigo Castro, de 20 anos, está no seu terceiro ano de cursinho e sonha com uma vaga em Medicina. "É quase impossível conseguir entrar em uma boa faculdade. A concorrência é grande e, no ano passado, até pensei em desistir." Ele prestou vestibular para Arquitetura e passou. "Mas o que quero mesmo é ser médico." Com tanto tempo na sala de aula, já se tornou conhecido dos professores e funcionários. "Sempre fiz Etapa e todo mundo sabe quem sou. Como conhecem a minha história e vêem a minha persistência, eles me dão mais atenção, me ajudam a não cair no desânimo." Mas, apesar da "forcinha extra", ele conta que é muito repetitivo fazer cursinho por tanto tempo. "Já sei tudo o que vai acontecer. Tem professor que é superprevisível e não muda a aula de jeito nenhum. É preciso ter muita vontade para acordar todas as manhãs." Vontade é o que não falta a Tatiana Oliveira da Silva, de 21 anos. No seu quarto ano de cursinho, ela é chamada de "vovó" pelos amigos novatos. "Sou a mais velha da turma e isso é bem desagradável, mas já me acostumei com as piadinhas e levo tudo numa boa." Tatiana também tenta uma vaga em Medicina. "A maioria dos veteranos de cursinho quer Medicina, só um ou outro tenta Direito ou outra carreira. A concorrência é fogo." Ela conta que tanto tempo de cursinho enjoa. "A gente fica cansada, deprimida, mas, como não consigo estudar sozinha, é melhor ir para a aula e me concentrar." A pressão dos pais e dos amigos, afirma, é muito menor do que a dela mesma. "Sou eu a pessoa que mais me cobro. No começo, foi difícil lidar com o fracasso, mas agora já consigo manter meu psicológico em equilíbrio", diz. "E isso é muito importante na hora da prova." Com quatro anos de cursinho, Fernanda Correia Silva, de 21 anos, resolveu compartilhar sua experiência com os alunos mais novos. Tentando uma vaga em Arquitetura na USP, ela divide o tempo dos estudos com o Projeto Busca, um programa do Cursinho Psico-USP que orienta os novatos. "Com tanto tempo de vestibular, acho que posso ajudar quem está começando", conta. "Dou orientação de todo o tipo: formas de estudo, como organizar o tempo, opções de faculdades em outros Estados, de que forma aproveitar as bibliotecas. Foi a forma que encontrei de usar essa experiência." Persistência é o segredo dos veteranos No fim do ano passado, Fernanda entrou em uma faculdade particular. "Mas quero mesmo a USP e não vou desistir enquanto não entrar. Mesmo que tenha de fazer mais cursinho", diz. "Só espero que não seja preciso. Estou confiante de que o próximo janeiro será de comemoração, e não de frustração, como nos últimos anos." Campeã dos veteranos de cursinho, Adriana Oliveira da Silva, de 22 anos, também não vê a hora de acabar a tensão dos vestibulares. Ela já está há cinco anos fazendo cursinho porque precisa entrar em uma faculdade pública, justamente onde a concorrência é maior. "Quero fazer Comunicação Social, mas não posso pagar um curso particular e sempre estudei em escolas do Estado. Então, já viu, né? Minha base foi bem fraca." Ela sempre fez cursinho no Thema Educação, que é uma organização alternativa, para estudantes carentes. "A gente tem de ter muita paciência e persistência para não desistir porque, com o tempo, as novidades do cursinho acabam ficando monótonas." Para os vestibulandos que estão começando nessa semana, ela dá a dica: "É simples. Estude muito, aproveite todos os momentos e não desista nunca." Já Tatiana lembra que os novatos se deslumbram com o cursinho e acabam perdendo o objetivo de entrar na faculdade. "Costumam se encantar com os novos amigos e com a liberdade do cursinho e, muitas vezes, caem na diversão", afirma. "Quando você tem um sonho, agüenta qualquer coisa."

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