Vestibular: Hora da difícil decisão

Entre tantas possibilidades, aluno que conclui o ensino médio tem pela frente a árdua missão de optar por uma carreira, instituição e modalidade de curso superior, que pode ser presencial ou a distância

PUBLICIDADE

Por Lygia Ribeiro
Atualização:

Se por um lado o avanço da tecnologia e a evolução dos cursos de graduação trouxe mais opções e facilidades no acesso ao ensino superior, por outro todas essas variedades causam cada vez mais confusão na cabeça dos jovens. Isso porque, com tantos formatos (presencial ou a distância) e instituições disponíveis (públicas, privadas, em outras cidades ou países), parece uma missão - quase - impossível escolher um único caminho. 

PUBLICIDADE

A falta de orientação vocacional sólida ao longo do ensino médio e do cursinho tem levado a uma evasão alta nos primeiros anos de faculdade. É o que aponta pesquisa do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Segundo os dados, 49% dos alunos desistiram do curso no primeiro ano em uma instituição pública e 53% em faculdades particulares. Os dados analisados são de 2010 a 2015.

A confusão no momento de decidir a futura carreira, em geral no meio da adolescência, é comum. Luana Sevarolli, de 16 anos, quase fez a escolha errada. “Eu sempre fui muito bem em tudo na escola, e sempre quando você vai bem em tudo te associam a uma pessoa de Exatas.” A aluna do Colégio CPV pensava em fazer vestibular para Engenharia, mas no 2.º ano do ensino médio se encantou pelo teatro e agora está decidida a tentar uma vaga em Artes Cênicas. 

“Quando eu estava no 2.º ano, entrei em uma crise, de não saber mais o que fazer porque eu não gostava realmente das coisas que iria aprender em Engenharia”, conta. “Fiquei tentando negar muito que queria fazer teatro. Mas chegou um momento em que a única parte feliz da minha semana é quando eu estava fazendo teatro. Resolvi mudar mesmo.”

Antes de tomar essa decisão, Luana buscou ajuda. “Fiz dois anos de orientação vocacional. Não é só um teste que você faz. São cerca de cinco semanas de curso, em que uma orientadora vai te analisando e ajudando a chegar à profissão”, explica.

Eliezer de Paula, aluno do Cursinho da Poli na dúvida sobre que carreira seguir Foto: JF Diorio/ Estadão

Insegurança. Eliezer de Paula ainda não conseguiu fazer uma escolha segura sobre a carreira. Mesmo depois de concluir o ensino técnico, o estudante de 20 anos não desistiu da sua ideia inicial de fazer Medicina. Em 2018, ele decidiu se inscrever no Cursinho da Poli. “Fui para lá com Medicina na cabeça. Só que ali conheci outras áreas e pessoas, gente que trabalhou no mercado financeiro, por exemplo, e criei interesse pela área. Comecei a pensar em Economia, Engenharia. Acabei ficando na dúvida entre esses três cursos.”

O estudante chegou a prestar vestibular no ano passado, mas não passou. Em 2019, ainda no cursinho, a dúvida sobre que profissão seguir permanece. Ele recebeu uma proposta para estudar Medicina na Argentina, o que o fez focar um pouco mais nessa área durante os estudos. Mas tem medo de fazer a escolha errada. “Eu penso ‘Será que eu vou me arrepender depois?’ Vou ter o trabalho de sair e começar tudo de novo. Se eu for para outro Estado, vou ter de largar tudo. O meu maior medo é abandonar a minha família”, afirma o aluno.

Publicidade

Já Felipe Hideki, de 17 anos, tem certeza do que quer estudar no ensino superior. “Sempre gostei de Exatas e quero prestar vestibular para fazer Matemática. Para mim, foi algo natural, não tive tanta confusão na hora da escolha.”

No último ano do ensino médio no Colégio Santa Amália, ele conta que a escola organizou feiras estudantis e visitas guiadas aos câmpus da USP, além de receber ex-alunos já formados para conversar sobre carreiras. “O colégio busca formar professores que ofereçam uma boa orientação vocacional para os alunos, no sentido de dar a eles não só a formação intelectual, mas que façam boas escolhas em todas as áreas da vida”, afirma Zélia Miceli, gestora do Santa Amália.

Orientação. Apesar das dificuldades, é possível evitar as armadilhas. É o que procurou fazer a bióloga Mariana Rocha na época em que fazia o cursinho pré-vestibular. Na opinião dela, saber escolher bem os caminhos que seguiria foi a ponte para levá-la a crescer profissionalmente até fora do Brasil. “Durante a fase do cursinho, fiquei um pouco na dúvida sobre quais eram as possibilidades que eu teria na minha área. Cheguei a visitar outros cursos, pensei em Medicina, visitei faculdades de Direito, mas percebi que o que realmente eu queria era Biologia.” 

O passo seguinte foi pensar na faculdade. “Ainda no colegial prestei o vestibular e passei de primeira em várias faculdades públicas, mas eu queria mesmo as melhores no meu curso e que poderiam me dar chances no exterior depois. Fiz um ano de cursinho e passei na USP (Universidade de São Paulo).” A opção não foi baseada apenas na qualidade do curso, mas em fatores econômicos. Os pais de Mariana não poderiam pagar por um curso particular. Foi também com a ajuda de bolsas que a bióloga saiu do País para fazer mestrado em Oceanografia na França. Hoje Mariana faz doutorado no Havaí. “O segredo é estar bem atento às oportunidades, mas também fazer a sua parte. Buscar, pesquisar bem, criar seu network, porque isso abre muitas portas. Muita gente sonha em estudar fora e acha que tem de ter muito dinheiro, mas eu diria que não. A questão é buscar e tentar traçar o seu caminho.” 

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

A orientação de Mariana veio também da sua passagem pelo cursinho pré-vestibular. Lá, ela conheceu Vera Lucia da Costa Antunes, coordenadora pedagógica do Objetivo, que estimula os alunos a buscarem o máximo de informações sobre suas áreas de interesse. Para Vera, os estudantes não devem ter medo de se arriscar ao prestar vestibulares para outros Estados, ou mesmo outros países. “Mas não é só sonhar alto. Se eu quero fazer Medicina, preciso saber que vou ter de estudar muito. Não posso escolher uma carreira porque ela é a mais fácil, nem porque a faculdade é mais barata, mas porque eu gosto dela.” 

O suporte dos pais também é fundamental. “Às vezes escuto dos pais que os filhos não são capazes de passar em uma universidade pública. Outros acham que vão gastar muito dinheiro se mandarem os filhos para outros locais. Isso é loucura. É preciso acreditar que esse jovem pode conseguir boas oportunidades, até de estudar fora, se ele quiser”, conclui Vera Lucia. 

PARA UMA BOA ESCOLHA

Publicidade

Autora do livro Adolescência e Escolha da Profissão e coautora de Orientação Vocacional/Ocupacional e Orientação Vocacional: Aspectos Teóricos, Técnicos e Práticos, Caioá Lemos dá dicas para quem está na fase de decidir o que vai fazer no ensino superior:

  • Na graduação, aposte nos cursos que ampliam, e não nos que restringem. Deixe a especialização para a pós. “Há muitos cursos que mais atrapalham do que ajudam porque se tornaram muito específicos e, na verdade, são desdobramentos de graduações mais tradicionais”, diz a especialista em orientação profissional e vocacional para jovens. “Por exemplo, havia em Psicologia a disciplina de Psicopedagogia. Virou uma graduação, mas é um curso ‘armadilha’. Não forma nem um psicólogo nem um pedagogo, e deixa a pessoa com uma atuação limitada no mercado. Faz mais sentido fazer Psicologia e se especializar em Pedagogia.”
  • Para a primeira graduação, a especialista recomenda um curso presencial porque ajuda o jovem a construir uma rede de relacionamento. “Não é só a questão do conhecimento que você vai obter e que é importante. Ter contato com pessoas, trabalhar em grupo e dividir tarefas são coisas fundamentais para quem quer ser um bom profissional.” Mas a psicóloga faz uma ressalva: “É bom que os cursos a distância existam. Para pessoas que moram em áreas mais remotas, eles funcionam.”
  • Na dúvida sobre o que estudar, procure ajuda profissional. “A pessoa ter decidido pelo menos os primeiros anos do futuro profissional, por isso é preciso escolher bem. Não é só um curso que o estudante está decidindo, é quem vai ser no futuro. Então é importante buscar informações e uma ajuda profissional, quando não consegue fazer a escolha sozinho.”

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.