Reconhecer altas habilidades de estudantes é o maior obstáculo

Unesp de Bauru desenvolve projeto para identificar e estimular os ‘superdotados’

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Por Luiz Fernando Toledo
Atualização:
Symon e Maria Clara, de 10 anos, são acompanhados na Unespapós questionário identificar que eles têm altas habilidades e necessidades diferenciadas de ensino Foto: ACEITUNO JR / ESTADÃO

BAURU - Entre as falhas apontadas pelo estudo encomendado pelo Ministério da Educação (MEC) está a confusão no reconhecimento de uma criança com altas habilidades. O relatório aponta que há “ausência de técnicas mais modernas para identificação” desses estudantes, fazendo com que pessoas com superdotação sejam confundidas com outros diagnósticos, como déficit de atenção, hiperatividade, transtorno desafiador opositor, entre outros.

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Segundo o documento, há “descrédito dos professores na superdotação apresentada pelos alunos”, por causa do despreparo dos profissionais das escolas regulares para lidar com a área, bem como falta de prioridade nos municípios.

O relatório estabelece 12 principais problemas no atendimento oferecido pelos serviços públicos de altas habilidades no Brasil. Entre eles estão a falta de material didático-pedagógico adequado e a ausência de equipamentos e de recursos tecnológicos, além de poucos profissionais capacitados. Há até dificuldade em locomover os alunos para essas salas de recursos, o que seria motivo para eles não participarem de atividades.

Estudo

O despreparo para descobrir e tratar os alunos adequadamente foi analisado pela professora Vera Lúcia Capellini, do Departamento de Educação da Unesp em Bauru. A especialista investigou, a partir de 2003, se as escolas de educação básica do município atendiam alunos com superdotação. “Descobri que não havia nenhuma identificação nem atendimento.” Dez anos depois, em 2013, a pesquisa se repetiu. A situação continuava igual.

Foi aí que a Unesp, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e o governo do Estado, deu início a um projeto-piloto de identificação e atendimento a esses estudantes. A professora analisou um colégio de periferia com 289 alunos e, entre eles, 11 foram identificados com altas habilidades, por meio de uma avaliação multimodal, que utiliza diferentes instrumentos pedagógicos e psicológicos.

O resultado – 3,8% do total – indicou proximidade dos 5% de superdotados apontados pela Organização Mundial da Saúde em qualquer população. “Comprovamos que qualquer escola, mesmo na periferia, pode ter esses alunos”, diz Capellini. A especialista quer tentar expandir as avaliações para todas as escolas do município nos próximos anos.

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Como ainda não foi possível ampliar o atendimento, os pesquisadores decidiram dar início a um projeto de extensão universitária atendendo à demanda espontânea. Se um pai desconfia que o filho possa ter altas habilidades, pode solicitar os testes na instituição.

Atendimento

As atividades ofertadas para as crianças identificadas com altas habilidades vão de ioga a aulas de música e robótica, dependendo da área em que se destacam e têm interesse.

A auxiliar-geral de produção Niegin Prado, de 29 anos, recebeu de um professor a suspeita de que seu filho, Symon, de 10 anos, poderia precisar de acompanhamento para altas habilidades. Após mais de um mês de testes na Unesp em Bauru – que incluem até um extenso questionário com os pais –, o menino começou a fazer um acompanhamento semanal no local. “Sempre percebi que ele tem um gênio muito forte e se foca muito nas coisas que pensa e gosta, além de facilidade para decorar.”

A vendedora Michelle Mendonça, de 36 anos, também leva a filha Maria Clara, de 10 anos, para atendimento na universidade há um ano, por indicação de uma professora de artes que identificou grande facilidade da garota para desenhos. Após os testes, descobriu-se que também tem altas habilidades em escrita. “Eles ficaram mais focados e sabem lidar melhor com atividades em grupo”, conta Niegin. 

As principais irregularidades apontadas pelo relatório do MEC:

1 - Falta de espaço físico adequado e material didático-pedagógico

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2 - Falta de mecanismos de manutenção, suporte técnico para reposição e recursos para aquisição de equipamentos e tecnologia compatíveis com nível de desenvolvimentos dos alunos

3 - Falta de profissionais capacitados

4 - Dificuldade de locomoção dos alunos até a sala de recursos; alunos deixam de participar por não ter transporte

5 - Não há financiamento para contratar recursos para projetos de enriquecimentos em áreas específicas;

6 - Falta de fiscalização, supervisão e regulamentação nos municípios

7 - Escolas se negam a prestar atendimentos específicos, sobretudo sobre aceleração; maioria dos casos é realizada por meio de liminar

8 - Descrédito dos professores na superdotação apresentada pelo aluno

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9 - Formação de professor ineficaz

10 - Confusão no reconhecimento de uma criança que tem altas habilidades com outros diagnósticos, como déficit de atenção e hiperatividade

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