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‘Queria ser capaz de realizar algo na vida’, diz ganhador de prêmio

Willian Souza, aluno de escola pública que homenageia Anne Frank, escreveu sobre racismo, venceu concurso e viajou à Europa

Por Barbara Ferreira Santos
Atualização:

SÃO PAULO - Com a mesma idade que Anne Frank tinha quando morreu, o mineiro Willian Junio Moreira de Souza, de 15 anos, ganhou um concurso nacional de redação em homenagem à jovem alemã vítima do holocausto. Como Anne, ele passou dias e madrugadas escrevendo e reescrevendo textos, “escondido” dos familiares, sobre as discriminações que viu e sofreu. A mãe e os irmãos ainda não sabiam, mas a redação que Willian refez 18 vezes o levaria para a Europa. Especificamente para Amsterdã, na Holanda, onde a família de Anne Frank, judia, passou dois anos escondida em um sótão para fugir da perseguição nazista. 

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Negro, filho de uma empregada doméstica, Willian fez sua primeira viagem de avião por causa da premiação no concurso de redação da Confederação Israelita do Brasil, em parceria com a Federação Israelita de São Paulo (Fisesp). 

Ele foi o principal vencedor do torneio neste ano, entre alunos das cinco escolas públicas do País que homenageiam a jovem. Ganhou com um texto que fala sobre a luta pelos direitos humanos e a importância da história de Anne Frank.

Willian visitou o Tribunal Penal Internacional e conversou com juíza brasileira; para amigos, virou um exemplo Foto: Evelson de Freitas/Estadão

A vitória surpreendeu a família, os colegas e os professores da Escola Municipal Anne Frank de Belo Horizonte, onde Willian estuda. “Eu não gosto muito de estudar, então não achava que ia conseguir vencer”, conta o adolescente. “Não acreditei quando soube.”

A diretora da escola, Sandra Mara de Oliveira, não imaginava que pela segunda vez consecutiva um aluno da escola da capital mineira levaria o prêmio. “Nem quis ver o resultado, dizendo que um raio não cairia duas vezes no mesmo lugar”, diz. “Mas caiu.”

Para o criador do concurso, Alberto Milkewitz, diretor institucional da Fisesp, a metáfora é outra: “É como quando jogamos uma pedra na água e vemos os círculos se multiplicando. A mensagem de quem já ganhou repercutiu na escola e no bairro e se multiplicou.” 

Depois de anunciada a nova premiação, no início de agosto, o colégio foi só festa. Willian ficou ainda mais famoso - ele já era conhecido por ter sido eleito representante da escola na Câmara Mirim de Belo Horizonte. Com a premiação da viagem, veio mais uma surpresa: ele soube que havia sido eleito presidente da Câmara. 

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O menino que não gosta de estudar - mas que teve dedicação para seguir seus objetivos - havia atingido as metas prometidas no ano-novo. “Eu prometi para mim que ganharia as eleições e o concurso porque queria me sentir capaz de realizar algo na vida.”

Entre os colegas, ele se tornou um exemplo de persistência. “Ele inspirou todo mundo porque teve foco enquanto ninguém acreditava nele”, conta a amiga Taynara Kethlen Ferreira Alves, de 14 anos. “Muita gente pensou que ele ficaria metido com a viagem, mas, pelo contrário, tratou a gente melhor do que nunca e contou tudo o que viu na Europa.” 

O jovem viajou para o Velho Continente com o irmão Wesley Souza, de 20 anos. A escolha de quem o acompanharia foi feita por sorteio entre os três irmãos. Os pais, que vivem separados - a mãe em Belo Horizonte, com os filhos, e o pai, em São Paulo -, não puderam acompanhá-lo. 

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Aurenice Moreira da Cruz, de 44 anos, não poderia se dar ao luxo de abrir mão dos R$ 500 que receberia com faxinas naquela semana por causa de uma viagem. Além disso, precisava economizar para pagar as roupas que comprou para o filho “viajar arrumado” e separar um dinheiro como presente para o caçula. “Fiquei muito orgulhosa dele. Ele é preguiçoso para estudar, mas inteligente”, conta a mãe. 

Na Europa, a história de Willian também fez sucesso. No Tribunal Penal Internacional, em Haia, teve até de dar autógrafo para a juíza brasileira que compõe a corte, Sylvia Steiner. “Ela me mostrou fotos do julgamento de criminosos e explicou como é o trabalho dela”, conta o jovem. “Eu aprendi muito e sei que posso progredir muito além da viagem. Vou traçar novas metas.”

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