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Quartel é lugar para aprender uma profissão

Projeto Soldado Cidadão ensinará ofício e será porta para mercado de trabalho

Por Agencia Estado
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O entregador de pizzas Antônio Carlos Moreira da Silva, 18 anos, vai raspar o cabelo de trancinhas, em fevereiro, quando se apresentar no quartel para fazer o serviço militar. Ele se orgulha do penteado estilo afro, mas não lamenta o sacrifício, pois acha que valerá a pena. "Vou sair daqui com um ofício", promete Antônio Carlos, aluno da 7.ª série do ensino fundamental e lutador de capoeira, de olho nos cursos de formação profissional que poderão dar novo rumo à sua vida. Independentemente de onde for servir, o Exército lhe abrirá um leque de opções que, esta é a sua esperança, facilitarão o acesso ao mercado de trabalho. Antônio Carlos é um dos 360 mil jovens que se alistaram em 2003 nas juntas de recrutamento das Forças Armadas no Estado de São Paulo. Desse total, cerca de 110 mil foram selecionados na região metropolitana da capital, mas apenas 10 mil serão convocados. Da caserna para a vida civil É para esse contingente de recrutas - no País, eles somam 90 mil, escolhidos entre pouco mais de 1,5 milhão de alistados - que o governo promete ensinar uma profissão capaz de encaminhá-los na vida civil, dentro do projeto Soldado Cidadão. Os cursos da caserna serão certificados pelo Serviço Nacional do Comércio (Senac) e Serviço Nacional da Indústria (Senai). De acordo com o esquema anunciado pelo Ministério da Defesa, serão atendidos inicialmente 11 mil recrutas. Esse número deverá subir para 40 mil no próximo ano e, em seguida, para cerca de 100 mil, um pouco acima do total de incorporados, anualmente, nas Forças Armadas. "Ainda não sei como isso será feito, mas acho que bastará adaptar a rotina e o horário do quartel, para que, se necessário, os soldados possam freqüentar aulas fora", disse o tenente-coronel Edson Barboza Guimarães, comandante do 2.º Batalhão de Polícia do Exército (BPE), em Osasco, na grande São Paulo. O 2.º BPE, de 800 homens, recebe de 250 a 300 conscritos por ano. Sem dinheiro, baixa antecipada O serviço militar obrigatório dura de 9 a 12 meses, conforme as necessidades e os recursos das três forças - Marinha Exército e Aeronáutica. Em 2002, a primeira baixa foi antecipada de novembro para julho, porque faltou dinheiro. Além disso, muitas unidades funcionaram em meio expediente, para economizar a alimentação. "Este ano, voltamos ao normal", informa o tenente-coronel Tadeu Valdir Freitas de Rezende, chefe da Seção de Recrutamento do Comando Militar do Sudeste. Segundo o oficial mais de 90% dos incorporados são voluntários. Os recrutas recebem um soldo equivalente ao salário mínimo (R$ 240), além de uniforme, refeição e auxílio-transporte. O auxiliar de administração Michel Russo de Brito, 17 anos, torcia para ser dispensado. Isso só ocorreria em fevereiro, na peneirada final, quando são preenchidas as vagas. "Não gostaria de servir, mas se for convocado, vou aproveitar a chance para aprender uma profissão, talvez na área eletrônica", disse Michel. Carreira militar Recrutas que estão servindo e aprendendo uma profissão no 2.º BPE planejam se engajar para fazer carreira militar. "Emprego está muito difícil", observa Edson Machado, 19 anos, curso colegial completo. Com o engajamento, de preferência no setor de mecânica, seu soldo subiria para cerca de R$ 600 mensais. Seria um salário razoável para quem, como ele, quer fazer economia. "Mesmo não estando de serviço, costumo dormir no quartel, em vez de voltar para casa, na Freguesia do Ó (zona norte), porque assim garanto o jantar e deixo de pagar condução" revela Edson. Seu colega Hélio dos Santos Nicolau, que trabalhava como feirante e interrompeu o curso colegial ao ser convocado, também está desistindo de dar baixa. Gosto e vocação Nem todos aqueles que se alistam fazendo questão de servir alegam falta de emprego ou dificuldades financeiras. Marco Chuzyd, que mora na Vila Nova Conceição, na zona sul, e é um dos poucos recrutas a ir de carro para o quartel em Osasco, optou por fazer carreira por gosto e vocação. "Fui dispensado, mas insisti com o capitão para ser admitido", contou Marco, aluno do 3.º ano do ensino médio e praticante de capoeira. Se ficar para fazer carreira, pretende estudar mecânica. Leonardo Bezerra Silveira, que era funcionário do Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp) ao se alistar pretende aproveitar numa futura profissão a experiência de adestrador de cães, sua função no canil, onde treina o rottweiler Cronos para defesa e ataque. Seu projeto vai mais longe, pois está pensando fazer faculdade, influência talvez dos oficiais veterinários sob cujo comando trabalha. "Um adestrador sem curso superior ganha R$ 300 por animal que treina", calcula a tenente Sílvia Marques Lima, médica veterinária que se engajou na categoria de oficial temporário. É a primeira e, até agora, a única mulher do Batalhão de Polícia do Exército. Além dos cães de guerra do quartel, o canil cria e adestra farejadores de drogas, da raça labrador, para a Polícia Federal.

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