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Promotores apuram uso indevido do Fundef

Empresas "sem fins lucrativos" são contratadas por prefeituras, muitas delas sem licitação. Cursos são pagos com recursos do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental

Por Agencia Estado
Atualização:

Instituições privadas que vendem serviços na área de educação descobriram um novo e rentável filão de mercado: contratos sem licitação com prefeituras pagos com recursos do Fundef - o fundo nacional para o desenvolvimento do ensino fundamental. Promotores e vereadores de pelo menos três Estados - São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul - investigam os processos. "Às vezes, uma empresa sem fins lucrativos (uma das exigências para a dispensa da concorrência) é montada só para vencer sem licitação", diz o diretor do Departamento do Fundef, Francisco das Chagas Fernandes. Desde 1999, o Ministério da Educação (MEC) já recebeu mais de 1.900 denúncias de irregularidades envolvendo recursos do Fundef. Sem licitação Em Pirassununga (SP), dois casos são alvo da promotoria. O primeiro, a contratação de um curso de iniciação musical para professores em 2001. A prefeitura pagou ao Instituto de Desenvolvimento de Educação e Cultura (Idec) R$ 68 mil pelo curso - curiosamente a mesma quantia disponível do Fundef na ocasião, segundo o promotor José Carlos Thomé. No segundo contrato, a prefeitura adquiriu softwares educacionais com 170 aplicativos e 50 computadores para laboratórios de informática do Instituto de Tecnologia Aplicada à Informação (Iteai). O contrato custou R$ 275 mil. As duas instituições e o prefeito estão com bens bloqueados pela Justiça. A prefeitura não se manifestou sobre o caso. Suspeita de direcionamento Segundo Chagas, não há recomendação sobre licitação na lei que criou o Fundef. "Mas a norma do serviço público como um todo exige licitação. Se a verba do Fundef é um serviço público, é preciso a licitação", diz. "Ao se evitar a licitação, o que se pode imaginar é que tenha algum tipo de direcionamento por parte da prefeitura." A dúvida geral de promotores e vereadores é por que dispensar licitação na contratação de serviços que são oferecidos por dezenas de empresas, com preços, condições e qualidade distintos. "Experiência" de seis meses Em Biritiba-Mirim, Grande São Paulo, e Leme, região de Campinas, mais suspeitas. A primeira contratou sem licitação o mesmo Idec para cursos de iniciação musical para os professores usando como uma das justificativas o fato de a instituição ter experiência e reputação na atividade. Mas, quando foi contratado, o Idec só tinha seis meses de atividade. "A prefeitura atentou unicamente para a questão estatutária, que diz que a contratada não tem fins lucrativos, sem ver a inquestionável reputação ética-profissional (outro item exigido para a dispensa)", diz o promotor Ricardo Augusto Montemor, que propôs uma ação contra o prefeito, alegando irregularidade na dispensa da licitação. Ele quer a devolução aos cofres dos R$ 209.160,00 pagos pelo curso. Só um concorrente Em Leme, foi aberto um inquérito civil para avaliar suspeitas de irregularidades na contratação do Iteai e na redução do prazo para o pagamento das parcelas. A cidade, ao contrário das outras, promoveu licitação, mas só teve o instituto de Brasília como concorrente. O valor do contrato: R$ 1,5 milhão. Para representantes do Iteai e do Idec, as contestações judiciais são fruto de rixas políticas regionais. "O instituto já provou à Justiça que tem a prerrogativa da pesquisa. E é defensável a dispensa da licitação", diz o diretor-executivo do instituto, Helder Zebral. O Iteai tem 110 contratos pelo Brasil. "Às vezes com licitação, às vezes sem. Temos feito tudo dentro da maior lisura." "Futricas políticas" Um dos representantes do Idec, Francisco Luna atribui as suspeitas a "futricas políticas". "Já capacitamos mais de 2 mil professores. O tipo de curso oferecido depende da escola. São mais de 70 cursos, entre eles meio ambiente, português, matemática, literatura infantil, auto-estima etc. Estamos com a consciência tranqüila." A assessoria jurídica de Biritiba informou que, mediante consulta de preços, a empresa que melhor atendia ao município era o Idec. Disse ter dispensado a licitação "em face dos documentos apresentados pela empresa". O secretário da Fazenda de Leme, Ernani Arraes, disse que a redução do prazo de pagamento de 24 para nove parcelas se deveu a uma renegociação. "Fizemos licitação, mas só o Iteai concorreu. A empresa que tínhamos contratado antes não conseguiu acompanhar as exigências."

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