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Projeto carioca ganha prêmio ao garantir renda a refugiadas por meio da costura

Mulheres do Sul Global auxilia africanas que têm dificuldade para se inserir no mercado de trabalho formal

Por Rayssa Ferreira da Motta
Atualização:
Ateliê de costura é voltado paramulheres em situação de refúgio Foto: Yara dos Santos/Divulgação

É em uma casa de dois andares no Itanhangá, zona oeste do Rio, que um grupo de mulheres vindas do Congo e de Angola está enxergando uma chance de recomeçar suas vidas longe de um passado de violências físicas e psicológicas. No espaço, funciona um ateliê de costura voltado para o empoderamento econômico de mulheres em situação de refúgio.

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Iniciado em 2017, o projeto Mulheres do Sul Global acaba de ser escolhido como um dos dez mais inovadores do programa Shell Iniciativa Jovem. A entrega do prêmio foi na Malásia, em novembro.

O projeto emprega imigrantes africanas que, apesar da experiência prévia com a costura, têm dificuldades de encontrar uma vaga de emprego formal no setor de produção têxtil. A idealizadora da iniciativa, Emanuela Farias, conta que em alguns países do continente africano os cursos de costura integram a grade curricular das escolas. “A ideia é contribuir para que congolesas e angolanas possam exercer o ofício que carregam em suas origens e gerar impacto social em sua vida e de suas famílias”, explica.

Os encontros ocorrem uma vez por semana para elaboração de croquis, modelagens e corte das peças, geralmente feitas com tecidos doados ou reaproveitados. Depois disso, as profissionais levam o material para suas casas, onde confeccionam os produtos.

O modelo de trabalho flexível foi pensado para se adequar às necessidades das solicitantes de refúgio. Segundo dados do Programa de Atendimento a Refugiados e Solicitantes de Refúgio (Pares) da Cáritas RJ, o número desses pedidos aumentou 18% no Estado durante o primeiro semestre de 2018.

A maioria mora em regiões violentas e afastadas dos centros comerciais da cidade, em favelas ou programas habitacionais do governo federal, e ainda precisa dividir seu tempo entre os empregos e os cuidados com a casa e com os filhos. “Entre as refugiadas, o grupo mais sensível é o das mães de crianças pequenas, que são maioria entre as africanas”, conta Nina Quiroga, responsável pelas relações institucionais do Pares. Muitas dessas mulheres estão sem trabalho, porque não têm com quem deixar seus filhos.

Vivendo em uma cidade com um déficit de 32 mil vagas nas creches municipais e sem uma rede de apoio de parentes e amigos que ajude com as crianças, é quase impossível para essas mulheres conseguir um emprego com carteira assinada. É o caso da congolesa Betty Mvita, de 33 anos. Mãe de três filhos, uma menina de 8 e dois meninos de 5 e 2 anos, ela chegou ao Brasil em setembro de 2015 sem o marido, que só se juntou à família recentemente, e precisou cuidar sozinha de duas crianças enquanto estava grávida da terceira.

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Durante a gestação, chegou a passar por dois empregos, como faxineira em um hotel e como cuidadora de idosos, mas ambos exigiam um horário que não a permitia cuidar das crianças. No primeiro, trabalhava durante a noite e no segundo precisava dormir fora de casa de segunda a sábado.

Após o nascimento do caçula, se viu obrigada a parar de trabalhar para ficar com o recém-nascido. “Passei muito tempo atrás de um trabalho. Comecei procurando algo na costura, porque gosto muito de trabalhar com isso, mas depois passei a procurar qualquer coisa para ganhar só um pouquinho para viver com as crianças”, lembra Betty. “Mas não consegui nada até entrar para o projeto.”

A iniciativa tem dado certo. Hoje, a demanda já é maior que a capacidade de produção e novas candidatas estão passando por entrevistas para aumentar a equipe. “É preciso pensar a questão do refúgio e do acolhimento como ponto de partida para um recomeço e não como ponto final de um processo de perdas e rompimentos”, defende.

* É finalista do 13º Prêmio Santander Jovem Jornalista