Programas de trainee mudam para atrair jovens que querem empreender

Em busca de desafios e autonomia, talentos veem no empreendedorismo uma alternativa para carreira

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Por Cristiane Nascimento
Atualização:

O administrador de empresas Victor Vendramini França, de 27 anos, é líder de marketing digital da Johnson & Johnson no Brasil. Quando entrou para o programa de trainee em 2010, a área que coordena ainda não existia. Ela foi inspirada pela estratégia digital para os produtos da linha Johnson’s Baby que Victor desenvolveu durante o treinamento. “Quando fui efetivado, me deram autonomia para determinar o escopo da área.”

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Victor é o retrato de muitos jovens da geração Y que chegam ao mercado de trabalho. Eles sabem o que não querem: ocupar espaços irrelevantes e fazer trabalhos burocráticos. Eles não se permitem ser apenas mais um. “Ter liberdade é essencial para deixar a sua marca na empresa e ter certeza de que faz, de fato, diferença dentro dela”, diz Victor.

Em busca de projetos que lhes tragam realização e autonomia, muitos enxergam o empreendedorismo como alternativa. Nesse cenário, os programas de trainee – que há até pouco tempo eram os mais cobiçados por quem almejava carreira executiva – têm o brilho ofuscado.

“Alguns anos atrás, muitos alunos queriam entrar em uma multinacional, pois imaginavam que ali estariam as grandes oportunidades de treinamento e desenvolvimento”, afirma a professora Adriana Gomes, coordenadora do Núcleo de Estudos e Negócios em Desenvolvimento de Pessoas da ESPM. “Hoje, eles enxergam o emprego formal apenas como uma das várias possibilidades para construir uma carreira bem-sucedida.”

Uma pesquisa realizada no ano passado pela Cia. de Talentos aponta que 56% dos 46.107 jovens brasileiros de 17 a 26 anos ouvidos no levantamento pretendem empreender em algum momento.

Carla Esteves, diretora da consultoria, diz que o grau de realização profissional e o reconhecimento são dois dos principais critérios que guiam a decisão de abrir o próprio negócio. “Quanto maior a autonomia, a participação nas decisões estratégicas e a velocidade do retorno financeiro por meritocracia, maiores serão as chances de esse jovem alcançar a mesma satisfação que teria se empreendesse.”

José Guilherme Leme, de 25 anos, é chefe da área de efetividade organizacional da Coca-Cola Femsa no Brasil. Em 2011, o administrador formado pela ESPM abandonou um projeto pessoal para participar do programa de trainee da companhia. Ele era sócio-fundador de uma consultoria de empreendedorismo.

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Apesar da experiência como gestor de seu negócio, ele sonhava integrar o time de uma multinacional. “Confesso que entrei com um pouco de receio. Tinha liberdade absoluta e não sabia se conseguiria isso na Femsa”, afirma. Durante o programa, José Guilherme participou de um projeto de revisão organizacional na Venezuela e, depois de quatro meses, foi promovido a chefe no Brasil.

“Estava em um ambiente diferente, com uma língua que não era a minha, em um novo contexto macroeconômico e com um projeto em que nunca havia trabalhado. Foi um desafio imenso, muito importante para meu crescimento.”

Casos como o de José Guilherme eram pontuais na Coca-Cola Femsa. Até então, o envio de trainees ao exterior dependia de oportunidades específicas. A partir deste ano, no entanto, a multinacional dará início a um programa que selecionará jovens na Argentina, no Brasil, na Colômbia e na Venezuela. O programa prevê que eles trabalhem um período em seus locais de origem e outro no exterior – com o intuito, justamente, de oferecer aos jovens os desafios que tanto buscam.

O engenheiro Gustavo Basto, de 25 anos, é empreendedor, apesar de não se reconhecer como um. Até o fim de 2012, o gerente regional de logística da Química Amparo era trainee de uma concorrente multinacional. Durante o programa, Gustavo recebeu uma proposta para ganhar mais do que o dobro e estruturar um núcleo de logística. “A mudança, mesmo que para uma empresa menor, era, sim, uma oportunidade de ascensão. Mas a chance de criar algo do zero foi o fator determinante para deixar o trainee.” Perspectiva

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Há, porém, quem ainda busque a segurança e a estabilidade de uma carreira corporativa tradicional. Mariana Vidigal, de 26 anos, participou de quatro processos seletivos para o trainee da Ernst & Young até ser aprovada. “As corporações maiores têm um plano de carreira mais bem estruturado, o que possibilita um rápido crescimento e também uma perspectiva de futuro”, afirma.

Quaisquer que sejam as escolhas, é fundamental que haja clareza na negociação entre empregadores e empregados. “O que define o sucesso de um programa de trainee é o alinhamento das expectativas desses jovens com as estratégias da empresa”, diz Carla, da Cia. de Talentos. “Eles precisam saber o que esperam deles, como podem se desenvolver e até onde podem chegar a médio e longo prazos.”

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