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Olimpíada escolar avança para além da matemática

Competições de neurociências, informática, agropecuária, ambiente e saúde ganham força e colocam alunos na rota para estudar no exterior

Por Isabela Palhares
Atualização:

SÃO PAULO - As olimpíadas de conhecimento já fazem parte da rotina de muitas escolas brasileiras, mas novas competições com foco específico em algumas áreas do ensino têm ganhado a atenção de professores e a adesão crescente de alunos. No País, somam-se opções em neurociências, informática, agropecuária, saúde e meio ambiente para alunos do ensino médio. 

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Segundo os organizadores, os eventos buscam mostrar o lado prático do que é ensinado em sala de aula e incentivar a curiosidade pelo conteúdo científico. Foi o que aconteceu com Caroline Magalhães de Toledo, de 18 anos, que participou por dois anos da Olimpíada Brasileira de Neurociência e foi aprovada na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

“Sempre gostei muito de Biologia e me interessava por assuntos científicos. No 1.º ano do ensino médio, fiquei sabendo que havia um curso de férias de neurociências e resolvi participar. Adorei e vi que era o que queria fazer da vida.” O curso de férias é a entrada para a competição nacional, que depois leva o primeiro colocado para a olimpíada internacional. 

Curso de férias fez Caroline, de 18 anos, descobrir a neurociência Foto: DENNY CESARE

Exemplo. Caroline ficou em terceiro nas olimpíadas nacionais e, como queria aprofundar os conhecimentos na área, procurou uma pesquisadora na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pediu para ajudar ou observar os estudos que fazia. A estudante se destacou e até assinou uma pesquisa. “Sempre tive boas notas no colégio, mas acredito que a participação nas olimpíadas e meu envolvimento com a área acadêmica favoreceram a admissão na universidade americana.”

Alfred Sholl, coordenador nacional das olimpíadas, disse que a competição difere das tradicionais por abordar um conteúdo que não está normalmente contemplado no currículo básico dos colégios, mas surge de forma transversal ao que é ensinado. “Mostrar para o aluno como o que ele aprende em sala de aula pode contribuir para a sociedade dá um estímulo muito grande. Nós precisamos de mais cientistas e pesquisadores. Por isso, eventos assim são tão importantes.”

Segundo Sholl, a competição teve início em 2011 com a participação de alunos que tinham aulas em apenas dois cursos em todo o País. Neste ano, já são 11 comitês em diferentes cidades brasileiras, com o envolvimento de mais de 500 alunos.

Há ainda eventos que buscam atrair até mesmo um público mais jovem, com até 11 anos. É o caso da Olimpíada Brasileira de Informática (OBI), organizada pelo Instituto de Computação da Unicamp, que tem categorias para participantes a partir dos anos finais do ensino fundamental (do 5.º ao 9.º ano). 

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Para os alunos mais novos, a proposta é a resolução de problemas de lógica e computação, mas sem o uso do computador. O objetivo é despertar o interesse pela área e detectar talentos potenciais para programação. Para os de ensino médio, a prova exige conhecimento de variados níveis de programação. Já a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) organiza a Olimpíada Brasileira de Saúde e Meio Ambiente (Obsma), também voltada a alunos a partir do 6.º ano do fundamental até o médio. O objetivo é incentivar os estudantes a aprender, pesquisar e investigar ações educativas sobre os dois assuntos.

Enquanto isso, a Olimpíada Brasileira de Agropecuária (Obap) é voltada para alunos de ensino médio técnico, com o objetivo de propor desafios práticos e ligados às atividades que, depois, os estudantes podem desenvolver no mercado de trabalho. Em uma das edições, os competidores tiveram de simular uma inseminação artificial e, em outra, medir um terreno com GPS. A competição, que está em sua sétima edição, reuniu no ano passado quase 700 equipes e mais de 1,8 mil alunos de todo o País na primeira fase. No primeiro ano havia apenas 50.

“A olimpíada ganhou uma aproximação muito grande com o mercado de trabalho e atraiu muito os jovens. Fez com que eles se engajassem e se interessassem mais pelo o que estudavam na escola”, disse Marcelo Bregagnoli, reitor do Instituto Federal do Sul de Minas, que organiza a competição. 

Gabriel da Silva Miguel, de 18 anos, estava na equipe vencedora da competição no ano passado, quando cursava o 3.º ano do ensino médio. Conhecer tantos jovens com o mesmo interesse pela agropecuária reforçou seu desejo de cursar Engenharia Agronômica no Instituto Federal do Sul de Minas, onde também fez o ensino médio integrado ao técnico. “A prova e as conversas que tive com aquelas pessoas me mostraram como eu gostava do assunto e queria fazer diferença nessa área.”

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Aluna com deficiência visual é medalhista em olimpíada

Aos 13 anos, Kimberly Santos Pereira já é medalhista da Olimpíada Nacional em História do Brasil. Além de ter resolver os desafios propostos pela prova, ela também superou a deficiência visual. Há dois anos, a organização da competição, que realiza as cinco primeiras fases online, passou a fornecer a prova ao Instituto de Cegos Padre Chico para que fosse traduzida ao braille. 

"Eu sempre gostei de história. Então, quando fiquei sabendo que havia a prova em braille, tinha certeza de que iria participar. Só é uma pena que outras olimpíadas não façam isso, porque eu gostaria de entrar em outras competições. A exclusão do deficiente ainda é muito grande", disse Kimberly. Ela nasceu com baixa visão, após a mãe ter tido rubéola durante a gravidez. Ela estudo no instituto, sabe ler braille e tem aplicativos no celular e computador que a ajudam a ler as telas. 

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Em cada uma das cinco fases da olimpíada, os alunos, que montam equipes de quatro integrantes, têm uma semana para pesquisar e discutir o assunto e depois responder as perguntas. "Nossa prova tem um formato diferente que permite a participação de todos. Nossa prova mede o quanto o aluno consegue aprender em uma semana, não o conhecimento imediato dele. Além de estimular o trabalho em grupo", contou Cristina Meneguello, coordenado da olimpíada. 

Kimberly contou que, assim que as questões chegavam, sua equipe dividia a prova para que cada um pesquisasse um pouco. Depois, eles se reuniam para discutir e formular as respostas. "Fazia a pesquisa sozinha no meu celular e aprendi muito nesse período sobre a escravidão e maus tratos", contou. 

Segundo Cristina, no primeiro ano, o instituto participou com duas equipes e, em 2016, com três. "A adaptação para todas as pessoas ainda é uma demanda que estamos engatinhando para atender. Os alunos ficaram muito felizes de poder participar, porque em outros programas e competições a resposta que eles recebem é de que alguém pode ler as perguntas para eles. Isso não é incluir, não é garantir o mesmo tipo de participação", disse.