O divã dos alunos da USP

Serviço do Instituto de Psicologia recebe 5 casos de estudantes em crise toda semana

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Por Paulo Saldaña
Atualização:

Sonho de milhares de candidatos, conseguir vaga na USP não é sinônimo de felicidade para alguns deles. O Serviço de Aconselhamento Psicológico da Cidade Universitária recebe em média cinco estudantes por semana em busca de apoio para situações ligadas ou não à vida acadêmica, que vão da solidão provocada pela distância de casa a desilusões amorosas.

 

 

Ligado ao Instituto de Psicologia, o plantão de aconselhamento é oferecido a alunos e moradores da vizinhança do câmpus. Em 2009, 60% das 436 pessoas atendidas eram estudantes da universidade.

 

 

Segundo a coordenadora do serviço, Maria Luisa Schmidt, boa parte dos alunos enfrenta problemas com as exigências da vida acadêmica. Mas é da moradia estudantil, o Crusp, que sai a maior parte dos casos. “Há muitos conflitos causados por morar com pessoas com quem não se tem afinidade”, diz. Problemas com álcool e drogas não são regra, mas também aparecem nos consultórios.

 

 

Quem faz o atendimento são alunos do 4º ano de Psicologia, orientados por professores e psicólogos. “A gente não trabalha com diagnósticos, não queremos reforçar rótulos.” O serviço conta com uma rede de 50 clínicas credenciadas para as quais pode encaminhar pacientes. O plantão funciona na quarta-feira, das 9 às 11 horas, no bloco D do instituto.

 

Solidão

Stella Rita Theodoro levou quatro longos anos de cursinho para passar no vestibular da USP. Aprovada em 2008 no curso de Letras, ela trocou Jundiaí (SP) por um apartamento no Crusp.

 

 

“No começo tudo é curtição”, diz Stella, de 27 anos. “Depois vem o choque. A família está longe, os amigos também. E você percebe que isso vai durar muito tempo.” Um ano e cinco meses depois de entrar na USP, Stella ficou deprimida. “A grande dificuldade era ter a consciência de estar sozinha.”

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Em maio do ano passado, Stella já tinha passado por três apartamentos do Crusp. Todas as mudanças foram causadas por problemas de adaptação com os colegas. O fim de um relacionamento contribuiu para o abalo emocional. Stella passou a ter enjoos e insônia. Procurou aos prantos o Serviço de Aconselhamento Psicológico. “A psicóloga disse que eu precisava costurar minhas roupas, algo que minha mãe fazia para mim. Foi uma coisa muito simbólica da necessidade que eu tinha de me cuidar sozinha.”

 

 

Atendida numa clínica, Stella vê avanços, mas ainda não pensa em parar. “Agora construí minha vida em São Paulo. Trabalho, faço capoeira, tenho um espaço.” O semestre passado foi o primeiro em que a estudante não repetiu nenhuma disciplina. Neste, conseguiu sua primeira nota 10.

 

 

'Namoro falido'

Um “namoro falido” levou Beatriz (nome fictício), aluna do 3º ano de Física, a procurar o Serviço de Aconselhamento Psicológico. Sem ter sido atendida na primeira tentativa, pelo excesso de pacientes, ela insistiu e voltou na semana seguinte.

 

 

Beatriz, de 23 anos, parecia tranquila quando conversou com o Estadão.edu, no início do mês. Mas o tal “namoro falido” com um colega de faculdade continua. O ciúme e as brigas já têm afetado seu desempenho na USP. “Isso está atrapalhando outras coisas na minha vida, está atingindo tudo em que me envolvo”, diz. “Percebi que, se não resolver as coisas comigo mesma, vou mudar de namorado e só transferir meus problemas para outra pessoa.”

 

 

Apesar de ainda não ter solucionado a situação, Beatriz acredita que acertou ao procurar aconselhamento psicológico. “Achava que resolvia sozinha, mas não vou esperar chegar ao fundo do poço.”

 

 

Adaptação

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Como todos os alunos do 5º ano, Bruno Nalio Costa não vê a hora de se formar em Medicina Veterinária. Mas, ao contrário da maioria dos colegas, Bruno, de 21, não está empolgado. Depois da batalha do vestibular e de anos de curso, acha que escolheu a carreira errada – o que, segundo ele, tem provocado uma série de conflitos, principalmente com a família.

 

 

“Está sendo difícil dizer para meus pais que não é isso que quero”, afirma. A opinião dos pais é de que Bruno está desperdiçando a chance que suou para conquistar. Para ele, o problema é muito maior. Bruno critica as diretrizes do curso quanto ao uso de animais para produção de alimentos em grande escala. Diz que isso contribuiu para que virasse vegetariano. Também se sente deslocado. “É muito oba-oba, só tem festa”, reclama. “Na Veterinária as pessoas são rudes, alienadas. Não sabem nem o nome do reitor.”

 

 

Bruno parece tímido, mas fala com desenvoltura. Procurou atendimento psicológico em março e, desde então, tem sessões semanais. “Nunca faltei. Aliás, nunca cheguei atrasado.”

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