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MPF denuncia cinco por vazamento do Enem

Acusação é por peculato, violação de sigilo e corrupção passiva

Por Carolina Stanisci
Atualização:

O Ministério Público Federal em São Paulo denunciou à Justiça na sexta-feira passada pelos crimes de peculato (furto praticado por servidor público), corrupção passiva (exigir vantagem indevida) e violação de sigilo funcional cinco pessoas envolvidas no vazamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). As penas podem variar entre 6 e 30 anos.   Para o MPF, são responsáveis pelos crimes três funcionários da empresa Cetros, integrante do Consórcio Nacional de Avaliação e Seleção, contratado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais: Felipe Pradella, Marcelo Sena Freitas e Filipe Ribeiro Barbosa. Dois intermediários do grupo, Gregory Camillo Oliveira Craid e o empresário Luciano Rodrigues, também foram denunciados.   Segundo um dos procuradores que assinaram a denúncia, Kleber Marcel Uemura, não era certa a acusação contra Rodrigues, uma vez que ele havia apenas mediado o contato dos fraudadores com jornalistas de diversos veículos. Após conversas com o procurador da República Rodrigo Fraga, que também assina a denúncia, optou-se por também incluir o empresário na denúncia à Justiça.   O que pesou contra o Rodrigues foi a gravação feita pelos jornalistas de O Estado de S.Paulo. "Eles falavam, na gravação feita pelos repórteres do jornal, que iriam dividir o dinheiro entre cinco pessoas e não em quatro", afirmou Uemura. "Eles estavam previamente acertados."   O MPF pede também que seja considerada a continuidade na prática dos delitos, uma vez que os acusados furtaram a prova duas vezes (peculato), revelaram seu conteúdo três vezes (violação de sigilo) e pediram, também por três vezes, dinheiro para entregá-la (corrupção passiva). Se o juiz considerar a tese do MPF e os condenar, o grupo poderá ter a pena aumentada entre um sexto e dois terços.     ABSTENÇÃO O vazamento da prova foi alertado ao Ministério da Educação pelo jornal O Estado de S.Paulo, em 1º de outubro, após encontro de dois repórteres com os fraudadores. O cancelamento do Enem causou prejuízo em torno de R$ 45 milhões ao erário. O exame, que seria aplicado a 4,1 milhões de estudantes no início de outubro foi remarcado para esse último final de semana.   Após o adiamento do Enem, universidades como a USP, a Unicamp e a PUC-SP anunciaram que não usariam o exame em seus vestibulares. Isso contribuiu para os altos índices de abstenção na prova ontem e anteontem: cerca de 1,5 milhão de estudantes deixaram de fazer a prova.     EXTORSÃO Pradella, avaliado como mentor do crime, é acusado também pelo crime de extorsão (pena varia entre 4 a 10 anos). No dia 1º de outubro, depois que o jornal O Estado publicou a notícia sobre o vazamento, ele ligou para um dos repórteres pedindo R$ 10 mil "para não lhe fazer mal", afirma a denúncia do MPF.   De acordo com os procuradores, o tipo penal de furto comum não se aplicou ao caso. Pradella, Sena e Ribeiro estavam trabalhando para uma empresa que estava executando um serviço público e assinaram com o empregador compromisso de manter os dados a que tivessem acesso "sob rigoroso e absoluto sigilo".   Segundo é narrado na denúncia, participaram diretamente dos peculatos Pradella, Sena e Ribeiro.No dia 21 de setembro, foi furtada a "Prova 1". No dia 22 de setembro, foi levado da gráfica um exemplar da "Prova 2". Os atos de corrupção passiva foram cometidos nos dias 29 e 30 de setembro, quando eles pediram dinheiro pelas provas a jornalistas de veículos diversos.       Veja também:  Mais de 1,5 milhão faltam ao Enem  Enem vaza e MEC anuncia cancelamento   CONTATOS COM JORNALISTAS A denúncia relembra que, no dia 29 de setembro, Rodrigues entrou em contato com o jornal O Estado e com o jornal "Folha de S.Paulo" informando que conhecia dois rapazes que tinham as provas do Enem e que eles tinham interesse em vendê-las para a imprensa.   Após esses contatos, outros se seguiram. Nos dias 29 e 30, Pradella e Craid iniciaram seu plano para tentar vender as provas, mantendo contatos, todos infrutíferos, com diversos meios de comunicação além de O Estado, como "Folha de S.Paulo", revista "Época" e a TV Record.   Os jornalistas de O Estado se reuniram com a dupla em 30 de setembro. Perguntaram quanto Pradella e Craid queriam pelas provas e eles pediram R$ 500 mil. A equipe do jornal viu a prova, memorizou algumas questões, enquanto gravava o encontro, que foi fotografado a distância. Os jornalistas disseram que, embora o material fosse de interesse público, o jornal não pagava por informações.   A proposta não foi aceita por Pradella e Craid, que alegaram que o dinheiro teria que ser dividido entre cinco pessoas. No mesmo dia, o jornal procurou o ministro Fernando Haddad (Educação). Passou dados suficientes para que as autoridades decidissem que a prova era mesmo do Enem. No mesmo dia em que o jornal O Estado publicou a notícia sobre a fraude, o MEC anunciou o cancelamento da prova.   Além dos peculatos atribuídos aos cinco acusados, o MPF aponta que Pradella, Sena e Ribeiro cometeram violação de sigilo por três vezes, ao mostrar a prova para Ribeiro e Craid e às equipes de O Estado e da rede Record. Já Ribeiro e Craid violaram o sigilo duas vezes, quando a prova foi mostrada ao jornal e à TV.   Fraga e Uemura apontam que a corrupção passiva ocorreu três vezes: nas negociações com O Estado, Record e "Época". Nos contatos com o jornal "Folha de S.Paulo", a vantagem indevida não chegou a ser pedida, apenas mencionado o interesse financeiro, mas sem a estipulação de valores, condição fundamental para a caracterização da corrupção passiva.   A denúncia pode ser recebida nos próximos dias pelo juiz titular da 10ª Vara Federal Criminal de São Paulo.  

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