Militante da questão racial prepara cilada para professora da UnB

A idéia foi exposta com clareza num e-mail enviado ao moderador de uma mesa-redonda

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Por Agencia Estado
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Num episódio que marca novo lance de tensão racial na primeira universidade federal a criar o regime de cotas para o exame vestibular, os alunos da Universidade de Brasília (UnB) enfrentam uma situação de perplexidade desde a descoberta de uma operação clandestina para tentar desmoralizar uma das mais respeitadas pesquisadoras do País, a professora Lúcia Avelar, diretora da Instituto de Ciência Política. Conhecida por ter assumido um papel ponderado nas investigações em torno de um professor acusado de cometer ofensas racistas em sala de aula, cobrando que todas as partes envolvidas fossem ouvidas antes de qualquer deliberação, Lucia Avelar aceitou convite para participar de uma mesa-redonda sobre eleições e democracia no Brasil. O que ela não sabia é que se pretendia aproveitar a oportunidade para, conforme palavras textuais do aluno que idealizou o plano, deixá-la com "cara de trouxa". A idéia foi exposta com clareza num e-mail enviado ao moderador da mesa-redonda por um estudante chamado Gustavo Amora, celebrizado pelo costume de gravar declarações de professores suspeitos de manifestações racistas. Numa conversa em tom de cumplicidade, como quem dá uma instrução, Gustavo explica o que deve ser feito: "Você já sabe, né: me passa a palavra no primeiro momento, eu destruo com ela, você não me corta em nenhum momento, deixa ela lá com cara de trouxa e depois agradece e passa a palavra para o próximo." O plano foi descoberto graças a uma trapalhada digna de qualquer comédia de cybercafé. Em vez de mandar o e-mail para o estudante que estaria à mesa, aliado em suas denúncias, Gustavo Amora enviou-o para o endereço coletivo do curso - e todos os alunos o receberam, criando um fato absurdo e ridículo ao mesmo tempo. Momentos depois, ele enviou um segundo e-mail, sustentando a versão pouco crível de que tudo não passara de uma brincadeira. "É uma falta de respeito", afirma Fabíola Nader, aluna do 3º semestre e uma das organizadoras da mesa-redonda. "É inaceitável." Para Bruno Nogueira, estudante que considera que a universidade tem sido "omissa" em casos de racismo, "essa atitude não se justifica. Não tem nada a ver uma coisa com a outra". A UnB reserva 20% de suas vagas a alunos considerados negros - uma comissão resolve as dúvidas examinando fotos dos concorrentes, por critérios subjetivos que não são divulgados, conforme explicação ouvida na direção da universidade, "da mesma forma que ninguém esclarece notas num exame de redação". Lucia Avelar, que tem a pele muito clara e seria considerada branca na maioria dos ambientes, fez carreira na Universidade de Campinas, tem pós-doutorado em Yale, nos Estados Unidos, e produziu trabalhos considerados importantes sobre voto feminino. Ela cumpriu um lugar importante nas investigações a respeito do professor Paulo Kramer, acusado de utilizar o termo "crioulada" em sala de aula. Contra uma condenação rápida, ela pediu um voto de confiança. Em entrevista recente ao Estado, disse que "Kramer é destemperado, mas não é racista". Procurado, Gustavo Amora não respondeu aos pedidos de entrevista. A mesa-redonda ocorre amanhã, mas, por exigência de Lucia Avelar, o moderador foi substituído.

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