'MEC tem de ser firme nesse começo'

Para Alleoni, para que o ramo progrida no Brasil, são necessárias uma regulação intensa do MEC e que as instituições mais tradicionais abracem a educação a distância

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Por Gustavo Zucchi
Atualização:

SÃO PAULO - Luis Reynaldo Alleoni, membro da Câmara de Cursos da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo (PRCEU-USP) e coordenador de um curso a distância na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da mesma universidade (Esalq-USP), se considera um “entusiasta, com os pés no chão”, em relação ao crescimento exponencial da educação a distância. Para ele, para que o ramo progrida no Brasil, são necessárias duas coisas: uma regulação intensa do Ministério da Educação (MEC), em especial durante esse boom dos últimos seis meses, e que as instituições mais tradicionais abracem a educação a distância e intensifiquem a quantidade e a qualidade dos cursos. 

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Como você está vendo esse crescimento da educação a distância após a última resolução do MEC?

A educação a distância é uma modalidade muito interessante. Ela realmente possibilita que muitos alunos que não teriam condição de estudar, em especial na pós-graduação, possam ter essa oportunidade. Acho que o preconceito com a EAD diminuiu. Já fui menos, mas hoje eu sou mais otimista em relação à modalidade. Se as aulas forem ministradas por um profissional competente, com bom conhecimento na área de atuação, ele consegue adaptar o curso que dava presencialmente para o curso a distancia. O principal ponto dessa resolução foi o que possibilitou as instituições a credenciarem o curso a distância sem ter o presencial. Acho que essa explosão mais recente se deve a essas não exigências. Muitas instituições talvez estivessem em compasso de espera e, com a liberação, puderam implementar o curso. 

Manter a qualidade dos cursos é o principal desafio? Muitas instituições podem querer apenas “marcar território” em certas carreiras?

Talvez esse seja o maior desafio. A atratividade financeira é alta. A instituição pode oferecer um curso mais barato e conseguir arrecadação com a escala de alunos matriculados. Em um presencial, você tem 40, 50 alunos por turma. Em EAD, pode ter 200, 300, até 400. Com isso, você diminui a mensalidade e isso pode ser atrativo financeiramente. Agora a questão da qualidade: acredito muito na regulação do mercado. Com o tempo, o mercado vai filtrar as instituições que estão oferecendo um curso de qualidade e aquelas que só querem se aproveitar do boom.

A participação de instituições mais tradicionais, como a própria USP, é importante para esse processo?

As universidades mais tradicionais não podem ficar de fora desse processo. A própria USP, que era reticente a esse tipo de curso, está se abrindo bastante. Várias unidades da USP estão se abrindo, algumas mais tradicionais, outras que começaram há menos tempo. É importante isso inclusive para aproveitar o material da pós-graduação para os alunos da graduação. Você pode editar os vídeos e utilizar como reforço para quem está entrando agora na universidade. Como as mais tradicionais geralmente têm uma qualidade maior, elas forçam as outras a melhorarem seu padrão de qualidade. E tudo isso contribui para oferecer ao público mais opções de onde e como estudar. 

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'As universidades mais tradicionais não podem ficar de fora desse processo', destaca Alleoni, da USP Foto: Arquivo Pessoal

Você, como entusiasta de EAD, teme que com o boom surjam cursos de menor qualidade?

Acho que o mercado que vai dizer. Se o público perceber que determinados cursos estão com valor muito abaixo do mercado, oferecendo condições que estão fora do padrão comum e sem oferecer um curso de qualidade, eles vão perder alunos, que vão migrar para cursos de instituições de mais renome. Será interessante as instituições de renome entrarem na educação a distância. Aí não fica aquela ideia de que as instituições mais conhecidas dão presencial e as menos conhecidas, a distância. 

E o papel do MEC na manutenção da qualidade desses cursos? Qual será daqui para frente?

É preciso ter uma regulação bem rigorosa, que na própria norma a gente veja que as visitas serão feitas esporadicamente, não em todos os postos, mas em alguns. Até essa visita in loco do MEC será importante para não deixar essa medida descambar.

O MEC tem de ser mais firme então nesse início?

Não digo mais firme porque em seis meses a gente ainda não tem condição de avaliar, mas tem de ser bem firme nesse começo para mostrar que está de olho. Não pode virar um balcão de negócios para alguns oportunistas aprontarem. Se criarem cursos ruins, tem de descredenciar. Tem de ter um mecanismo regulador para deixar no mercado apenas as que forem realmente boas. Senão, queima o filme da educação a distância. 

Tem demanda para todos esses novos cursos na sua opinião?

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Uma coisa importante de ressaltar é que o presencial e a distância têm públicos diferentes. EAD tem um mercado crescente e competitivo. Em Piracicaba, no nosso curso a distância, temos alunos do Ceará ao Rio Grande do Sul. Eles não teriam condição de viajar 2 mil quilômetros para ter uma aula da USP. Por que não vamos propiciar a esses estudantes a condição de ter esse curso? 

Mudança leva a menor burocracia

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Publicado em 21 de junho do ano passado, o Decreto 9.057 do Ministério da Educação (MEC) propõe melhorar a qualidade regulatória da área de educação a distância.

A palavra-chave nessa mudança foi desburocratização, para facilitar a criação de polos por parte das instituições de ensino superior e contribuir para que o País atinja a Meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE), que tem o ambicioso projeto de aumentar a taxa bruta de matrículas no ensino superior em 50% e a líquida em 33% na faixa etária entre 18 a 24 anos.

Antes do decreto, a regra que determinava como o ensino a distância no País funcionava era de 2005, quando muitas das tecnologias que contribuíram para a qualificação da EAD ainda não eram de acesso da população em geral. 

“Faremos o constante monitoramento das políticas agora implementadas para mensurar o impacto e a aplicabilidade da política pública”, afirma o secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior, Henrique Sartori.

As principais novidades

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Só a distância Com as novas resoluções, instituições de ensino superior (IES) podem se credenciar para cursos de educação a distância (EAD) sem o credenciamento para cursos presenciais. Mas ainda é necessária autorização prévia para o funcionamento de qualquer uma das duas modalidades.

Visitas in loco Outra novidade é que o MEC não terá mais a necessidade de visitar cada um dos polos de EAD. O ministério concentrará sua fiscalização na sede da instituição de ensino superior que detém o controle dos polos de educação a distância, para verificar se a estrutura é adequada para os cursos oferecidos. 

Restrições Instituições já credenciadas para criar polos de ensino a distância poderão criar novos polos, dependendo de seu conceito institucional (CI) mais recente. As instituições com CI 3 poderão criar até 50 polos/ano; as com CI 4, até 150 anualmente; e as com CI 5, até 250 polos por ano. Ou seja, quanto maior a qualidade da instituição, mais polos poderá criar. 

Graduação necessária Apesar de as regras valerem para cursos de graduação e pós-graduação lato sensu, as instituições de ensino superior não poderão oferecer cursos a distância sem ter na sua grade a oferta regular de cursos de graduação. 

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