Com contrato CLT, governo quer limitar gasto com salários nas universidades federais

MEC quer reduzir para 70% o gasto das universidades federais com a folha de pagamento nos próximos dez anos

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Por Adriana Fernandes e Julia Lindner
Atualização:

O Ministério da Educação (MEC) quer reduzir para 70% o gasto das universidades federais com a folha de pagamento nos próximos dez anos. Hoje, pagar a folha corresponde a 85% do total das despesas. A meta faz parte da estratégia para diminuir despesas com pessoal por meio de mudanças no modelo de contratação de docentes e servidores para o regime CLT. O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior diz que isso vai prejudicar as pesquisas e elevar a rotatividade de profissionais. 

Quase metade da força de trabalho na administração federal está nas instituições de ensino. O orçamento para todas as 63 universidades federais em 2019 é de R$ 49,621 bilhões – são R$ 42,3 bilhões com salários. 

O ministro daEducaçãoAbraham Weintraub Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

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Ao Estadão/Broadcast, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, antecipou que as universidades que aderirem ao Future-se, ação federal para captar verba privada, “vão ter de passar a contratar via CLT, e não mais via concurso público”. O texto do novo programa, que ainda será enviado ao Congresso, tem sofrido resistência de parte das universidades.

Secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Lima afirmou na segunda-feira que a redução de 15 pontos porcentuais nos gastos com servidores e professores representaria a maior reforma do governo, depois da previdenciária. “A CLT é um método, mas não é o objetivo em si. O objetivo é ter uma limitação de despesas com pessoal”, disse ele.

Lima disse que o Conselho Superior das universidades determinará quais serviços poderão ser prestados por funcionários contratados pela CLT. Destacou, ainda, que as contratações terão de ser feitas por meio das Organizações Sociais (OSs) e pelas fundações de apoio. Segundo ele, a adesão ao modelo das OSs, tipo de associação privada sem fins lucrativos, pode ser feita pelas universidades em parte ou em sua totalidade.

“Vamos botar uma autorização legal, caso as autoridades assim o desejem, por autonomia delas, para que em partes, ou em sua totalidade, possam se transformar em OS”, observou o secretário. Ele citou o caso do Instituto Internacional de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, que quer se tornar uma OS. 

A estimativa do governo é a de que 40% da força de trabalho das universidades se aposente nos próximos dez anos. Com isso, caso o Future-se seja aprovado no Congresso, os novos funcionários vão seguir o novo plano de carreira e a despesa de pessoal tende a cair. Segundo Lima, a ideia também é criar uma espécie de Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) com o Future-se.

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O MEC já negocia com o Ministério da Economia a possibilidade de instituir o contrato de desempenho com as universidades. Por meio dessa nova modalidade, aquelas instituições que conseguirem economizar despesas poderão ficar com os recursos para serem aplicados em outras áreas, principalmente em pesquisa. Hoje, o que sobra retorna para a União.

Também está em estudo a possibilidade de o governo oferecer benefícios às instituições que economizarem. O modelo, disse Lima, é parecido com o que é feito no Reino Unido.  O foco do contrato é justamente estimular as universidades a diminuir despesas com pessoal.

"Não queremos apenas ter mais receitas para as universidades, mas também sustentabilidade, controle do lado da despesa. Hoje, 85% das despesas das universidades são com gasto de pessoal. Essa despesa vai crescendo por conta das promoções e dos reajustes”, afirmou o secretário.

Questionado se as universidades vão aderir ao Future-se, ele respondeu não ter dúvidas disso. “Todas vão aderir, é uma questão de tempo. Vai ter mais recurso. E, quem gosta de educação, quer mais recurso. O Future-se é isso, só que ele exige mais comprometimento do lado da despesa também”, argumentou.

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Para ele, o quadro das universidades com gasto de pessoal é mais grave do que os Estados. Dados comparativos do ministério mostram que as instituições federais de todas as Unidades da Federação desembolsam bem mais com pessoal do que os governos estaduais. A instituição  com maior gasto é a Federal do Amazonas, com 89% das despesas totais usadas para manter a folha de pagamento. Já os gastos totais do Amazonas com pessoal são de 52%. 

Em geral, as universidades públicas do País têm gastos elevados com a folha de pagamento. Nas três estaduais paulistas - USP, Unicamp e Unesp -, a despesa com salários supera o patamar de 88% dos repasses do Tesouro Estadual.  Nos últimos anos, quando atravessou grave crise financeira, a USP chegou a fazer até um plano de demissão voluntária (PDV) de servidores técnico-administrativos. 

“A despesa de pessoal das universidades (federais) já extrapolou até os limites dos estados na LRF”, afirmou Lima. “Se a universidade fosse um Estado, ela estaria em calamidade financeira.” Ele destacou que há um “núcleo duro” no MEC alinhado ao Ministério da Economia que defende mais responsabilidade fiscal. “Achamos que não é só oferecer mais recurso, mas também investir em gestão. Existe relação entre maior investimento e melhor qualidade, mas não é linear. O fato é que o Brasil já alcançou um nível de investimento em educação bem equivalente aos países desenvolvidos”, avaliou.

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O secretário afirmou que um dos principais objetivos do MEC é mudar a forma de distribuição de recursos com base em indicadores de resultado.“Atualmente, o orçamento destinado às universidades está privilegiando o Sudeste ao invés do Norte e Nordeste, o que tem acentuado as desigualdades regionais. O 'Future-se' ajudará a corrigir essas iniquidades.

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Contratação sem concurso precariza instituições, diz presidente de sindicato

Presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), Antonio Gonçalves critica a proposta de contratar via CLT. "A seleção não se dará por concurso e isso traz vários desdobramentos, desde falta de continuidade em pesquisas, aumento da rotatividade de profissionais e maior interferência política no quadro docente", diz. "Imagina as universidade aparelhadas por fundamentalistas indicados pelo governo da vez. Isso rompe com a autonomia universitária." Para Gonçalves, a justificativa econômica para a proposta seria um "verniz". "O ministro diz que hoje o orçamento das universidades está comprometido com a folha, não sobra para investimento. Isso decorre dos sucessivos cortes que vêm desde 2014, que tornaram a proporção da folha maior no orçamento. Se mantivéssemos o padrão anterior de investimento, a folha não teria esse impacto todo", afirma. /COLABOROU FELIPE RESK

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