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Escolas de SP têm ‘guerra de cartas’ de pais contra e a favor de restrições na fase vermelha

Colégios podem abrir, mas parte decidiu reduzir aulas presenciais nas próximas semanas

Por Julia Marques
Atualização:

SÃO PAULO — As restrições às atividades presenciais em escolas particulares de São Paulo têm sido motivo de embates em grupos de pais. De um lado, há aqueles que defendem que as escolas diminuam o atendimento presencial neste momento, com alta de internações pela covid-19 em todo o Estado. De outro, estão os que pedem que a escola continue operando normalmente para atender as crianças depois de tanto tempo fechadas.

Consideradas serviços essenciais, as escolas no Estado de São Paulo tiveram o aval para continuar abertas mesmo na fase vermelha, a mais restritiva do plano de flexibilização da quarentena. Apesar da autorização para abrir com 35% da capacidade, alguns colégios já informaram que vão reduzir o atendimento pelo menos nas próximas duas semanas e enviaram comunicado às famílias para que só mandem o filho à escola em caso de necessidade.

Alunos do Colégio Oswald de Andrade, na zona oeste, reivindicaram a interrupção imediata de todas as atividades presenciais pelo tempo que for necessário. Escola havia retomado as aulas presenciais no dia 1º de fevereiro Foto: TABA BENEDICTO/ ESTADAO

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Os comunicados das escolas desagradaram algumas famílias, que pedem atendimento presencial normalmente. No Colégio Santa Cruz, na zona oeste, por exemplo, pais de alunos de 3 a 7 anos enviaram uma carta à escola manifestando descontentamento com o plano do colégio de restringir as aulas presenciais neste momento. O colégio pediu que os pais só enviem os filhos a partir de segunda em caso de “extrema necessidade”.

Para eles, não existe aula em modelo virtual para crianças pequenas e o vínculo dos alunos, que acabaram de iniciar a vida escolar, com o colégio fica prejudicado diante da suspensão das atividades. “O impacto disso em crianças que já passaram o ano passado quase inteiro sem escola é incomensurável”, dizem os pais em um comunicado à escola.

Mãe de duas meninas, de 10 e 12 anos, matriculadas no Santa Cruz, a publicitária Alexandra Santos, de 47 anos, não concordou com a restrição. “A batalha para conseguir que as escolas fossem incluídas como serviços essenciais foi enorme. As crianças estão melhores na escola do que em casa, do ponto de vista sanitário e psicossocial.” A mais velha se adaptou bem ao ensino remoto, mas a mais nova teve dificuldades.

Alexandra pretende mandar as crianças para a escola.“Temos de tentar manter o mínimo de normalidade para elas depois de tudo o que passaram.” O advogado Alessandro Ghilardi, de 42 anos, pai de um menino de 9, também foi contra a restrição. “Imagina uma criança de 9 anos, sem ter uma atividade, em casa. Como fica a cabeça dela?”

Ghilardi diz que a suspensão agora seria mais uma quebra na rotina do filho e também questiona que o atendimento presencial não será com professores da classe da criança. Para o advogado, os riscos maiores de infecção ocorrem em outros ambientes como bares, restaurantes e festas clandestinas. Estudos já indicaram índice menor de transmissão em escolas desde que sejam seguidos os protocolos.

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O Santa Cruz informou, por meio de nota, que compreende que o momento é difícil para todos, “especialmente para as famílias com crianças menores, para quem o ensino remoto apresenta maiores limitações." E afirma que decidiu privilegiar o ensino remoto durante as próximas duas semanas “para contribuir com a redução de circulação de alunos e educadores no momento mais crítico da pandemia e diante do colapso do sistema de saúde." Em comunicado anterior, a escola já havia indicado “aumento preocupante” de casos de familiares contaminados ou suspeitos.

No Colégio Equipe, que suspendeu as aulas presenciais, a movimentação das famílias em apoio ao fechamento também causou atritos. Um grupo de 150 pais e mães enviou uma carta à escola dizendo ser favorável à decisão de suspender as aulas por um tempo. O texto circulou em grupos e causou reações de todos os lados. “Está sendo uma ‘pega pra capar’, tem muitas opiniões divergentes”, diz Cafi Otta, de 42 anos, pai de um aluno do 8º ano.

Otta, que era favorável à reabertura e mandou o filho para a escola, “mudou de lado” diante da piora da pandemia no Estado. A ausência de leitos de UTI para qualquer pessoa preocupa. “Quem adoece não tem para onde ir”, diz ele, que por pouco não conseguiu vaga em terapia intensiva após ter sofrido um acidente. Otta reconhece, porém, que a situação é complexa e que não se deve julgar quem defende a escola aberta neste momento.

Segundo ele, o apoio para que a escola fique fechada agora é uma questão coletiva. “É pensando não só na comunidade escolar, no microcosmo, mas no bairro, na cidade inteira.” O Equipe marcou reunião com pais de todos os ciclos para ouvir as necessidades específicas. Nesta sexta-feira, 5, alunos do Colégio Oswald de Andrade, na zona oeste, reivindicaram a interrupção imediata de todas as atividades presenciais pelo tempo que for necessário. Os alunos argumentam que a maioria das famílias é de classe média ou alta e têm condições de permanecer em casa em isolamento social.

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Os professores do Oswald também se manifestaram pedindo que a escola suspenda as aulas para os que têm condições de acompanhar o ensino remoto. “Muitos de nós têm ido trabalhar com pavor e com o peso da responsabilidade que temos perante aqueles que vivem conosco e por quem também zelamos", escreveram os professores. O Oswald pediu que as famílias avaliem a necessidade de aulas presenciais nas próximas semanas e informou que vai reduzir o número de funcionários presencialmente na escola.

Ao Estadão, a diretora-geral do Oswald, Andréa Andreucci, disse que a escola prima pelas práticas democráticas e que a que a instituição também compartilha da mesma preocupação com os professores"A escola é o espaço social essencial para que a reflexão, o pensamento crítico e a possibilidade de debate aconteçam."

Pais e alunos do Colégio São Domingos, na zona oeste, também elaboraram uma carta em apoio à suspensão das atividades presenciais. Nesta sexta-feira, a escola optou por concentrar as atividades educacionais no modelo remoto. Os atendimentos presenciais serão excepcionais e restritos.

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O secretário estadual da Educação, Rossieli Soares, afirmou em coletiva de imprensa para anunciar a mudança de fase em todo o Estado que as escolas devem funcionar para os que mais precisam. Ele cita como prioridades alunos que precisam da alimentação escolar, os que não têm acesso a equipamentos e aqueles que estão com problemas emocionais. Também destaca a importância do colégio para os estudantes da educação infantil e em fase de alfabetização.

Cada unidade, em conversa com pais e professores, deve definir quais serão os alunos prioritários. Na rede estadual, ele prevê queda de 80% de circulação de pessoas da comunidade escolar. A previsão é reduzir a frequência de 2,5 milhões para 500 mil alunos nos próximos 14 dias. Já a circulação de professores e funcionários deve cair de 165 mil para 50 mil servidores.

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