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Enem 2020: UFSC cobra Inep após receber plano de salas com ocupação de 80%

Aplicador do exame diz que orientação é para 'confiar na abstenção'; prova ocorre neste domingo para 5,7 milhões de candidatos

Por Ilana Cardial e Julia Marques
Atualização:

A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) divulgou nesta sexta-feira, 15, uma nota em que questiona o Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep) após receber plano de salas com ocupação de 80% para a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Segundo a universidade, a condição para ceder dos espaços seria que as salas tivessem ocupação máxima de 40% da capacidade. Conforme o Estadão revelou nesta quinta-feira, aplicadores do exame indicam que as salas usadas para o Enem terão ocupação superior à prometida pelo Inep, de 50%. 

"O Inep e a Cesgranrio distribuíram os participantes utilizando 80% da capacidade das salas. Em 12 de janeiro, tão logo a informação chegou à Administração Central da UFSC, a Universidade enviou ofício às duas instituições solicitando que respeitassem o limite de 40%", destaca a nota. Segundo a universidade, até o fim da tarde desta sexta-feira, 15, não houve resposta. O Enem será aplicado neste domingo, 15, para 5,7 milhões de estudantes. A segurança sanitária do exame, realizado em meio à segunda onda da covid-19, vem sendo questionada na Justiça. 

Candidatos fazem a prova do Enem em 2019; Inep, responsável pela prova, diz que as datas de aplicação do exameestão mantidas Foto: Felipe Rau/Estadão

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As salas da universidade foram cedidas para o exame, mas não há, segundo a UFSC, envolvimento da instituição com detalhes operacionais das provas. A universidade destaca "riscos cada vez maiores em torno do contágio e diante da gravidade da situação" e afirma que enviou, na quinta-feira, 14, um ofício às Secretarias Municipal e Estadual da Saúde e ao Ministério Público Federal em Santa Catarina, alertando sobre a situação e destacando "o risco iminente de haver uma concentração de pessoas em um mesmo espaço físico por longo período".

Nesta quinta-feira, 14, a reportagem do Estadão mostrou que os planos para aplicação do Enem incluem alocar 32 estudantes em salas com capacidade para 40 alunos - ocupação de 80%. O Inep garantiu que as salas teriam apenas 50% da capacidade para cumprir o distanciamento entre os candidatos. Manuais de aplicadores obtidos pela reportagem destacam a orientação de distância de dois metros entre as carteiras, mas os aplicadores não sabem como garantir o distanciamento com o número de candidatos inscritos por sala. Foram ouvidos colaboradores de seis Estados. 

'Orientação é para confiar na abstenção', diz aplicador

Sem condições de garantir o distanciamento de dois metros entre candidatos do Enem, um assistente de coordenação local da prova procurou os superiores para relatar a dificuldade. "A resposta foi para que confiássemos na abstenção", disse ao Estadão em condição de anonimato. "Demos risada para não chorar." Secretários estaduais também apontaram que o governo conta com a falta de candidatos para garantir o cumprimento dos protocolos sanitários no exame.

O colaborador ouvido trabalha como assistente de coordenação de local de aplicação no Paraná. A sala será usada por 20 candidatos, mas, segundo conta, não é possível colocar todos eles a dois metros de distância. "Não cabem, sem a mínima condição." Esta é a quinta vez que o aplicador do Paraná consultado pela reportagem vai participar do exame na escola, uma unidade pública de educação infantil e ensino fundamental. A função que ele exercerá será a de verificar se procedimentos como metodologia de aplicação e controle do horário estão sendo cumpridos.

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Segundo afirma, pouca coisa mudou este ano na escola onde ele aplica o Enem em relação às edições anteriores. "(A ocupação) sempre foi em torno de 20 (candidatos), isso que nos deixou sem entender muito bem", disse. Ele diz que, para obter distanciamento de dois metros, seria preciso colocar apenas dez alunos na classe. "Temos este ano mais candidatos do que na edição de 2018, quando tivemos algo em torno de 240 participantes", falou. 

O contato para tratar sobre a lotação da sala foi realizado com os coordenadores superiores, funcionários contratos pela Cesgranrio para a aplicação da prova. Eles retornaram com a justificativa de projeção de abstenção, segundo afirma o aplicador no Paraná. O Estadão teve acesso a imagens de um aplicativo usado pelos colaboradores do exame que mostra a distribuição de estudantes por sala. 

Secretários estaduais também dizem ter recebido a explicação de que haverá abstenção ao questionarem os responsáveis pela prova sobre o uso de salas com número de candidatos superior ao ideal para garantir o distanciamento. O secretário de Educação do Rio Grande do Norte, Getúlio Marques, afirmou que diretores de escolas cedidas para o exame procuraram a gestão estadual e relataram solicitação de classes para 30 alunos. 

“Algumas comunicações que chegaram da Cesgranrio (empresa que faz a aplicação da prova) pediram para (diretores de escola) preparar logística para sala com 30 alunos. E colocamos essa dificuldade, de que com 30 alunos a nossa legislação nem permite", diz ele, em referência às normas em vigor, que restringem reuniões ao máximo de 15 pessoas, para reduzir o risco de contágio pela covid. 

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Segundo Marques, o Inep "alega que historicamente há uma abstenção de cerca de 27%”. Na sexta-feira, 8, o gestor estadual encaminhou ofício ao MEC pedindo o adiamento do exame. Na edição passada, o Enem registrou ausência de 23,1% candidatos no primeiro domingo de provas. 

Outro secretário, ouvido pela reportagem sob condição de anonimato, também diz que aplicadores em seu Estado receberam solicitação para salas com 25 a 30 alunos. A justificativa dada aos colaboradores pelos responsáveis pela aplicação da prova, de acordo com ele, é que a abstenção alta garantiria o distanciamento em sala. 

Nos últimos dias, o Inep tem destacado que vai garantir o distanciamento entre candidatos nas salas, mas não respondeu às perguntas do Estadão sobre a ocupação dos espaços nem sobre a projeção de abstenção. Nesta quinta, o presidente do Inep, Alexandre Lopes, disse em entrevista ao Uol que as salas de aplicação do Enem terão "20, 30 pessoas". 

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"Quem fez (vestibular da) Unicamp e USP sentou em sala com 20,30 pessoas. Assim como vai fazer o Enem em sala de 20, 30 pessoas." A Fuvest determinou ocupação de 40% das salas e a Unicamp dividiu os inscritos em dois dias. O Estadão tenta contato desde quarta-feira com a Cesgranrio, mas não obteve retorno.