Em paz com o bolso

Para fazer a tão sonhada faculdade, estudantes têm à disposição vários programas de crédito; qualidade dos cursos, porém, nem sempre é boa

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Por Carlos Lordelo e Ana Bizzotto
Atualização:

Chegar à faculdade ainda é privilégio de poucos jovens brasileiros, apesar do aumento do número de vagas em universidades públicas e da explosão do ensino superior privado. Em 2009, apenas 14% da população de 18 a 24 anos estava na graduação. Para elevar essa taxa a 33% até 2020, o governo adotou como uma das principais estratégias a expansão do financiamento estudantil.

 

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Capitaneado pelo Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), maior programa do gênero, o mercado de crédito universitário se tornou tão promissor que tem estimulado bancos e as próprias instituições de ensino a criar ou ampliar as suas iniciativas de financiamento.

 

Em 2009, de cada dez matriculados nas instituições de ensino superior privadas do País, três recebiam financiamento, reembolsável ou não. O Brasil tinha, naquele ano, 1,2 milhão de alunos na graduação com esse tipo de ajuda. Só o Fies atendia a mais da metade desses universitários, segundo o Ministério da Educação (MEC).

 

No ano passado, o governo mudou as regras do Fies, que abriu inscrições ontem. Entre as alterações, estão a ampliação do prazo para a quitação da dívida de duas para três vezes o período financiado e a redução da taxa de juros para 3,4% ao ano para novos contratos.

 

"Essa série de medidas facilitou a tomada de financiamento e batemos o recorde de contratos firmados. Ao todo, 71.609 alunos foram beneficiados, enquanto que em 2009 foram cerca de 30 mil", diz o secretário da Educação Superior do MEC, Luiz Cláudio Costa.

 

Seduzido pelas novas condições do programa, o estudante Roberto Teixeira Campidele, de 22 anos, fechou contrato e paga 50% da mensalidade do curso de Administração da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap). "Estudei em colégio particular a vida inteira e meus pais sempre pagaram com muito esforço. Optei pelo financiamento e trabalho para ajudá-los", diz.

 

Campidele considera que "vale muito a pena" financiar a graduação, "desde que seja numa faculdade reconhecida pelo mercado". "O Fies atende a quem não é pobre o suficiente para conseguir o ProUni e não é rico o suficiente para conseguir pagar uma faculdade top."

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Formada em Psicologia na Universidade São Judas em 2006, Marisa Comninos, de 30 anos, deverá quitar o Fies até julho de 2013. "Não teria chegado onde estou sem o crédito", diz ela, que hoje trabalha no RH da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Mas é preciso avaliar a qualidade da faculdade. O que dizer de uma escola que cobra R$ 200 por uma graduação?"

 

Pesquisadores também fazem ressalvas ao programa. Para a professora da PUC-Goiás Ana Maria Gonçalves de Sousa, que em seu doutorado investigou o financiamento público estudantil, a ampliação do crédito "contribui para a privatização do ensino superior e reafirma o descuido do Estado com esse nível da educação".

 

Ana Maria diz que incrementar o financiamento não pode ser a única solução para o acesso à universidade. "O governo não tem estrutura para atender a toda a demanda. Nesse cenário, o setor privado se posiciona, com o incentivo indireto por meio do Fies. Isso gera revolta social, pois o jovem tem direito a educação, paga imposto para isso, e é como se ele tivesse de pagar de novo para fazer uma graduação."

 

Reembolsável - Outra maneira de obter crédito é por meio de programas das próprias escolas, a exemplo de instituições como a Fundação Getulio Vargas (FGV), Fecap, Insper e Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

 

Na FGV, 30% dos matriculados em Administração, Direito e Economia de São Paulo têm crédito. "É uma maneira de atrair os melhores alunos, que em geral vão para universidades públicas", diz o controlador do fundo de bolsas Ronaldo Toniete.

 

São alunos com o perfil de Roberto Aragão, de 23 anos, que a FGV quer. Estudante do 4º ano de Economia, ele recebe financiamento integral desde o início do curso. "Sair da faculdade devendo quase R$ 120 mil deixa qualquer um com medo. Mas na medida em que o curso avança, você vê os ganhos que a graduação proporciona."

 

Para o coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naércio Menezes Filho, o estudante está certo. Segundo o professor, uma pessoa com graduação ganhava, em média, R$ 2.487 em 2009, enquanto que a renda mensal de quem estudou até o ensino médio era de R$ 1.108.

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Investimento - Para o diretor executivo do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Estado de São Paulo (Semesp), Rodrigo Capelato, existe demanda para o crescimento do setor privado de crédito.

 

Bancos como Itaú Unibanco e HSBC abriram linhas só para financiar graduandos, e o mercado bilionário também atraiu empresas como a Ideal Invest, que criou, em 2006, o programa Pravaler. "Embora seja nosso maior concorrente, o Fies criou um know-how em torno do crédito universitário que fomentou a iniciativa privada", diz o diretor executivo da Ideal Invest, Carlos Furlan.

 

Reprovada no Fies, Marcia Pinto, de 28 anos, conseguiu financiamento do Pravaler para o curso de Psicologia. Mãe de duas crianças, a moradora de Embu das Artes, na Grande São Paulo, trabalha como promotora de eventos e estuda à noite, na Universidade de Santo Amaro (Unisa). "Ficaria pesado pagar R$ 780 por mês. Optei pelo crédito para ter uma folga no orçamento", diz. "Se o crédito te ajuda a conquistar o objetivo, ele é válido. Mas você precisa saber direitinho as condições de pagamento."

 

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SERVIÇO

  Fies - http://sisfiesportal.mec.gov.brO Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) é um programa do MEC destinado a financiar a graduação na educação superior de estudantes matriculados em instituições não gratuitas. A partir deste ano, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é o novo agente operador do programa e os juros caíram para 3,4% ao ano. O financiamento pode ser solicitado em qualquer época do ano.
 
ProUni - http://prouniportal.mec.gov.br O Programa Universidade para Todos (ProUni) tem como finalidade a concessão de bolsas de estudo integrais e parciais em cursos de graduação e sequenciais de formação específica, em instituições privadas de educação superior. Criado pelo Governo Federal em 2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096, em 13 de janeiro de 2005, oferece, em contrapartida, isenção de alguns tributos às instituições que aderem ao programa.
 
Pravaler - www.creditopravaler.com.brÉ um financiamento privado que permite financiar o pagamento de cada mensalidade em, no mínimo, 2 vezes. Com isso o estudante paga menos por mês durante o curso e tem pelo menos o dobro do tempo para pagar. O contrato é semestral e o estudante financia o curso todo apenas se quiser. No 1º semestre financiado, o estudante paga a matrícula para a faculdade, ou seja, financia no máximo 5 mensalidades. Nos demais semestres, o programa permite o financiamento de todas as mensalidades, inclusive a rematrícula. Também é possível financiar mensalidades atrasadas.O programa possibilita incluir no financiamento até 5 mensalidades atrasadas do semestre anterior, se a faculdade aprovar.Os juros variam de 0% a 1,89% ao mês.
 
Fecap - http://www.fecap.br/vestibular/financiamento.phpA FECAP oferece a partir deste semestre para os ingressantes o financiamento de seus cursos de graduação por até 7 anos. No primeiro ano da faculdade, o financiamento é de 50%, no segundo ano, de 40%, e no terceiro, de 30% (não há financiamento para o quarto ano).
 
Itaú Unibanco - www.paguemetade.com.brO Crédito Universitário Itaú está disponível em 30 grupos educacionais em quase 300 campi de 24 estados. Trata-se de uma linha de financiamento com taxas de juros subsidiadas - um curso de 4 anos é financiado em 8 anos com juros médio de 0,60% a 0,65% ao mês. O produto é disponível tanto para calouros como veteranos, que podem contratá-lo a qualquer momento do curso, inclusive com opção de incluir eventuais mensalidades atrasadas. O contrato é semestral e o aluno decide no início de cada novo período se necessita continuar ou não com o apoio do crédito. Quase 7 mil jovens no Brasil estudam com o apoio do programa. Destes, cerca de 80% são os primeiros na família a cursar faculdade.
  HSBC - www.hsbc.com.br/universitarioO Crédito Universitário é um crédito pessoal para financiamento do último ano da graduação em universidades conveniadas. O valor máximo do financiamento é de R$ 20 mil, que pode ser parcelado em até 12 vezes, com taxa a partir de 1,99% a.m. O estudante começa a pagar no mês seguinte ao contrato. O 2º semestre é pago somente quando ele termina de pagar o primeiro. 
 
Insper - http://www.insper.edu.br/institucional/bolsas-de-estudos/modalidadesCerca de 7% dos alunos da graduação do Insper tiveram seus estudos financiados pela própria universidade em 2010. Os 98 bolsistas receberam, em média, 61% de subsídio para o pagamento das mensalidades. A instituição tem duas modalidades de crédito e concede o financiamento, de 20% a 100% o valor do curso, levando em consideração apenas a situação financeira do estudante. A restituição do financiamento é corrigida pelo IPCA e o aluno assina um termo de compromisso em que garante ajudar um futuro bolsista ao restituir o crédito. As mensalidades dos cursos de Administração e Economia custam R$ 2.750.
 
ESPM - http://www.espm.br/Footer/Pages/PerguntasFrequentes.aspx (acesse o site  clique no assunto 'Bolsa de estudo')A partir deste ano, a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) passa a financiar integralmente os estudos de seus alunos da graduação por meio do programa Bolsa Solidária. As aulas do primeiro semestre começam no dia 14 de fevereiro e cerca de 50 famílias já preencheram a ficha de interesse no financiamento. Elas passarão por uma avaliação sócio-econômica e, se aprovadas, deverão renovar o pedido de crédito semestralmente. 
 
FGV - http://www.fgv.br/graduacao/diferenciais.asp Pioneiro no País, o programa de crédito educativo da Fundação Getulio Vargas (FGV) em São Paulo já atendeu a 18.500 estudantes da graduação em seus 45 anos de história.  O financiamento de bolsas acontece graças à colaboração de empresas e pessoas físicas (alunos, ex-alunos, ex-bolsistas, professores e funcionários). Atualmente, cerca de 30% dos alunos de Administração, Direito e Economia recebem financiamento da própria universidade. No curso de Economia, por exemplo, a mensalidade é de R$ 2.270. O financiamento tem restituição obrigatória e é corrigido pelo IGPM.

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