'É preciso demitir maus professores'

Professor da Universidade de Stanford defende aumento apenas para os melhores mestres

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Por Sergio Pompeu
Atualização:

Professor da Universidade de Stanford e integrante da Academia Nacional para Educação dos Estados Unidos, Eric Hanushek tem sido uma das vozes mais influentes no debate sobre um tema fundamental para o Brasil: a importância do investimento em educação para o desenvolvimento econômico de um país. O pesquisador, que participa hoje de um debate organizado pela Fundação Itaú Social, em São Paulo, alerta para o fato de que nem sempre a eficiência dos sistemas educacionais está umbilicalmente ligada ao gasto no setor. Hanushek argumenta que os EUA, por exemplo, gastam mais que países europeus, mas seus alunos têm notas inferiores em testes internacionais. Para ele, a saída passa por pagar melhor a professores que melhoram o nível de aprendizado dos alunos. E pela possibilidade de dispensar maus profissionais. "Estaríamos melhor se nos livrássemos dos professores particularmente ruins", disse, em entrevista concedida ao Estado na semana passada, por telefone, de Nova York. Há um certo consenso no Brasil de que a economia melhorou, o País tem uma democracia estável, tem recursos naturais. Mas especialistas alertam que um entrave ao desenvolvimento econômico é a falta de educação de qualidade. Qual o peso disso para o País hoje? Tenho trabalhado com dados da América Latina e toda a região tem o desenvolvimento retardado pela falta de qualidade das escolas. Basta ver o Pisa (teste internacional de habilidades básicas de estudantes de 15 anos), no qual o Brasil está bem atrás de todo o mundo desenvolvido e do Sudeste Asiático. Acho que este é o grande problema do Brasil. Um de seus trabalhos menciona o fato de o Brasil ficar no nível da Albânia em alfabetização. Quanto tempo leva para sair de uma situação desastrosa como essa? Não temos tanta experiência com países em desenvolvimento. Sabemos de alguns países europeus. A Finlândia é um exemplo sempre citado: nos últimos 20 anos, melhorou dramaticamente o nível de suas escolas. É uma tarefa difícil, porque exige mudanças efetivas na estrutura das escolas. Em países como o Brasil há uma presença muito forte dos sindicatos nas escolas e as pessoas não aceitam muito as mudanças. Você está falando de movimentos de longo prazo, que podem levar 30 anos. É difícil ter uma liderança política que persista na ideia de reformar escolas por 30 anos. A maioria dos líderes está preocupada com a semana que vem, uns poucos com o ano que vem e não muitos com os próximos dez anos. O sr. tem alertado sobre o fato de os Estados Unidos ficarem atrás de outros países desenvolvidos quando se olha o desempenho de alunos em testes internacionais. O país tem um grande investimento nessa área. O que está errado? Como vocês aí, aqui há grandes sindicatos que não querem ver mudanças na escolas. Temos sido bem-sucedidos porque nossas universidades são melhores que a de outros países e por ter um melhor ambiente institucional, com livre comércio e respeito aos direitos de propriedade. E também temos a possibilidade de importar bons trabalhadores. Tenho amigos brasileiros aqui que são pessoas brilhantes. Mas, ensino superior à parte, há um problema de qualidade no sistema educacional dos EUA? Definitivamente. A maior parte do meu trabalho é devotada a buscar meios de resolver isso. O problema dos EUA é muito parecido com o do Brasil: é assegurar que você tenha professores realmente bons nas salas de aula. É difícil. Em São Paulo, o governo concedeu um bônus recentemente aos servidores da Educação e foi muito criticado por professores. Eles afirmam que todos os docentes deveriam ganhar mais, o que ecoa uma visão aceita na sociedade de que são mal remunerados. Mas suas pesquisas indicam que aumentos de salários para todos não melhoram o nível da educação. Parto do princípio de que, se você tem exatamente as mesmas pessoas na sala de aula e apenas paga melhor, o único meio de obter melhorias é se elas trabalharem mais duro. E nos EUA não há evidência de que elas farão isso se você pagá-las um pouco melhor. Então, você pode conseguir alguma mudança no longo prazo, mas isso se outras pessoas forem encorajadas a se tornarem professores por causa dos salários mais altos. A situação do Brasil pode ser diferente. Da última vez que olhei o mercado de trabalho do País, vi que há vários professores com segundo emprego e muito absenteísmo. Então, é provável que, se pagar um bônus, você consiga fazê-los comparecerem mais. Agora, se você só der um aumento geral de salário, as evidências são de que os professores não tendem a ir à escola mais frequentemente. Eles ficam com o dinheiro extra e com o segundo emprego. A ideia, então, é atrelar os pagamentos à performance em testes como o Pisa? Exato. Mas você tem de ser cuidadoso quando atrela pagamento a performance, porque precisa olhar para o quanto um professor influencia no aprendizado. O problema é que sabemos que algumas crianças chegam à escola melhor preparadas que outras, por causa do que suas famílias lhes ensinam. E você não quer pagar o professor pelo que os pais do aluno fizeram. E como medir exatamente a melhoria que está ligada ao trabalho do professor? O que você precisa fazer é dar testes como o Pisa no começo e no fim do ano. Voltando às resistências à mudança: as pressões nos EUA não se comparam às do México, por exemplo, onde a proposta de acabar com o emprego vitalício de professores provocou greves. Isso acontece em vários lugares, em parte porque você não pode impor grandes mudanças só porque é governo. Você não pode apenas dizer: "Sabemos que você tinha um contrato de emprego vitalício, mas queremos quebrá-lo." Nos EUA, no México e no Brasil é preciso, talvez, "comprar de volta" alguns direitos, pagar mais para que eles aceitem um novo contrato. Particularmente em sistemas econômicos modernos, você não pode mudar as regras no meio do caminho sem consultar as pessoas. O Brasil já montou uma estrutura de avaliação da qualidade da educação. Mas ainda não temos testes que analisem o quanto o professor contribuiu efetivamente para o aprendizado do aluno. É muito bom ter um sistema de avaliação que te dê informação objetiva. Mas aqui nos EUA, pelo menos, não há dúvida de que todos na escola – o diretor, os colegas, os pais – têm praticamente a mesma visão sobre quem são os bons professores. Uma pesquisa usou testes para medir o valor adicionado pelo professor ao aprendizado e também pediu aos diretores de escola que avaliassem os profissionais. Os resultados são consistentes no quarto superior e no quarto inferior. Os melhores e os piores professores são os mesmos tanto na avaliação do diretor quanto no teste objetivo. Para os que ficam na posição intermediária é difícil fazer um ranking preciso. Mas você consegue colocar os professores nessas grandes categorias de forma razoavelmente acurada. E o que fazer a partir disso: pagar mais aos melhores, qualificar os médios e se livrar dos piores? Sim, em linhas gerais, apesar de não termos muita evidência de que você torna alguém melhor dando cursos. Mas temos evidência, sim, de que estaríamos melhor se pudéssemos nos livrar dos professores que são particularmente ruins. Qual sua opinião sobre a administração Barack Obama? Ele e seus assessores têm uma visão correta sobre a questão educacional? Como no Brasil, o governo federal não tem muito poder sobre a educação, feita nos Estados. Mas parte do dinheiro do plano do estímulo à economia é reservada à educação e Obama prometeu apoiar Estados com bons sistemas de prestação de contas ou que se preocupam em premiar bons professores. O importante é que Obama tem dito as coisas certas.

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