Cursos top da USP incluem menos alunos da rede pública

Calouros da rede pública são 25,7% em carreiras disputadas, contra 45,8% nas graduações com menos de cinco candidatos por vaga

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Por Victor Vieira
Atualização:
Gandolfi: 'Tive um ensino fraco e precisei correr atrás de muito conteúdo' Foto: JF DIORIO /ESTADÃO

SÃO PAULO - A proporção de calouros da rede pública nos cursos de baixa concorrência da Universidade de São Paulo (USP) é quase o dobro da registrada nas carreiras mais procuradas, como Medicina e Direito. Nas 56 graduações com menos de cinco candidatos por vaga no último vestibular, a taxa de alunos da escola pública é de 45,8%. Já no grupo de 20 cursos de maior disputa, cai para 25,7%. A média geral da USP é de 35,1%. 

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Os números por carreira estão tabulados em documento da Pró-Reitoria de Graduação, obtido pelo Estado. A USP nunca usou cotas, mas bônus no seu vestibular, a Fuvest, para candidatos da rede pública e pretos, pardos e indígenas (PPI). 

O objetivo da USP é ter, até 2018, metade de calouros da rede pública em cada curso, com 35% de PPI, proporção equivalente à população paulista. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) chegou a sugerir essa meta já para o ano que vem, mas a universidade recusou.

Com o objetivo de aumentar a inclusão, a USP vai decidir neste mês se usa o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para preencher parte das cadeiras. A ideia é reservar, na média, 15% de vagas para alunos de escola pública via Enem. Mas a mudança, prevista para o próximo processo seletivo, ainda depende do aval das faculdades e dos conselhos superiores da USP.

Na proporção de ingressantes PPI também há desigualdades fortes. No grupo de carreiras de baixa concorrência - boa parte de licenciaturas e cursos noturnos -, a taxa é de 24,5%. Já nas 20 mais procuradas é de 14,1%, ante 18,8% na média da USP. Algumas graduações top, como Medicina em Ribeirão Preto, matricularam calouros pardos, mas nenhum preto.

Apesar do avanço de inclusão na USP nos últimos anos, os números mostram fragilidades da política adotada. “O bônus tem esse perfil conservador, de não fazer a inclusão igualmente em todos os cursos”, explica João Feres Júnior, pesquisador da área de ações afirmativas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). 

Como dá pontos extras, e não reserva vagas, o modelo costuma ter efeito menor em carreiras disputadas, em que a nota de corte é alta. A Lei de Cotas, diferentemente, fixa o mesmo patamar para cada curso e turno das instituições federais de ensino superior. Até 2016, serão 50% de alunos da rede pública, com taxa de PPI equivalente à distribuição populacional de cada Estado. Para Feres Júnior, os resultados da USP ainda são “pífios”. 

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O movimento estudantil pressiona os conselhos superiores da USP para debater cotas já para o próximo vestibular. Mas a reitoria sinalizou que essa discussão deve ser feita só para as edições seguintes. Procurada, a USP não se pronunciou.

Dificuldades. Ex-aluno de escola estadual, Lucas Gandolfi, de 23 anos, conseguiu a aprovação na Fuvest só na sexta tentativa. “Tive um ensino fraco e precisei correr atrás de muito conteúdo”, conta ele, que começou Medicina na USP em 2015. 

A favor de reserva de vagas, o jovem também se preocupa com a permanência do estudante cotista depois de passar pelo vestibular de cursos concorridos. “Ele acaba sofrendo com as defasagens em relação aos outros”, diz, “Por isso, é preciso melhorar o ensino público.” /COLABOROU RODRIGO BURGARELLI 

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