Congresso começa a discutir cotas nas universidades

Audiência pública nas comissões de Educação e Direitos Humanos da Câmara é primeiro debate sobre o tema. Estudantes marcaram presença

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Por Agencia Estado
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Quase uma centena de jovens negros ocupou nesta segunda-feira, por alguns minutos, o corredor que liga os gabinetes de parlamentares ao plenário da Câmara dos Deputados. Em um protesto pacífico, enrolados em correntes para simular o período da escravidão no Brasil, os jovens gritavam palavras de ordem para os deputados, pedindo a aprovação das políticas de cotas raciais e sociais para as universidades. Pela manhã, os mesmos estudantes fizeram um abraço simbólico à Universidade de Brasília, primeira federal a adotar o sistema de cotas raciais. Eles também marcaram presença em uma audiência pública (foto) pedida por deputados das comissões de Educação e Direitos Humanos da Câmara para tratar do assunto. Início de debate Foi a primeira vez que a criação de cotas raciais e sociais nas universidades foi debatida dentro do Congresso desde que o Ministério da Educação apresentou projeto de lei que institui o sistema. A proposta reserva 50% das vagas nas universidades públicas federais para alunos oriundos de escolas públicas. Prevê, ainda, que dentro desse percentual sejam reservadas cotas para alunos negros e indígenas, comprovadamente de baixa renda e respeitando os índices raciais de cada Estado - por exemplo, 9% em Santa Catarina e 73% na Bahia. Notas iguais "Existe essa idéia de que a criação de cotas vai baixar a qualidade do ensino nas universidades públicas. Mas temos dados, como os levantados pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, mostrando que isso não é verdade", defendeu o frei David Santos, diretor da Educafro, uma organização não governamental voltada para educação de negros e pessoas de baixa renda. Segundo Santos, uma pesquisa mostrou que 48,9% dos beneficiados pelas cotas tiveram média acima de 7 no final do primeiro ano de aplicação do sistema na Uerj. Entre os alunos não beneficiados pelas cotas, 47,1% alcançaram a mesma média. "Praticamente, um empate técnico. As cotas estão derrubando os paradigmas de que os cotistas negros e pobres vão fazer cair o nível das faculdades", disse ele. Redução gradual Ele concorda com a idéia do MEC, de reduzir gradativamente o sistema de cotas com o fortalecimento da qualidade no ensino fundamental e médio da rede pública. "A cota, por ser tão provocativa, vai melhorar o ensino fundamental e médio e, melhorando, vamos conseguir com tranqüilidade dizer: chega de cotas." Para Santos, as instituições públicas estão cada vez mais se afastando das pessoas mais pobres, e uma das formas de manter as instituições elitizadas é através da taxa de vestibular. "Em 1968, 57% dos alunos da USP vinham da rede pública. Em 1993, eram 32%. Em 2000 caíram para 19%. Em 2002, depois que vários estudantes negros e pobres conseguiram na Justiça o direito de não pagar a taxa, já subiu para 21,6%", alegou. Constituição O advogado Hédio Silva Júnior contestou a alegação de que a criação de cotas é inconstitucional - tese defendida por diversas pessoas contrárias à proposta, como a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen). Segundo ele, a tese de igualdade que consta na Constituição deve ser traduzida pelo Estado em ações que transformem uma igualdade formal em igualdade de oportunidade e tratamento. "Compete ao Estado o dever de esforçar-se para favorecer a criação de condições que permitam a todos beneficiarem-se da igualdade de oportunidade e eliminar qualquer fonte de discriminação direta ou indireta", disse.

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