Tempo livre para brincar também educa

Brincadeiras são fundamentais para desenvolvimento e saúde das crianças, mas adultos têm colocado a diversão em segundo plano

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Por Paulo Saldaña
Atualização:

SÃO PAULO - Brincar é coisa séria. Por meio da brincadeira - não apenas de jogos educativos ou de atividades orientadas por adultos - as crianças aprendem lições importantes, como se relacionar umas com as outras e obedecer a regras. Assim, é imprescindível que haja tempo para a diversão. Segundo especialistas, no entanto, pais ansiosos pelo sucesso dos filhos têm se esquecido ou valorizado pouco esses momentos.

Desde os anos 1940, pesquisas sobre o desenvolvimento humano já identificam o protagonismo das brincadeiras na formação das crianças, sob os aspectos cognitivos, emocionais, físicos, sociais e morais. Mais recentemente, a neurociência identificou evidências de como o cérebro recebe e processa informações e estímulos colhidos do ambiente pelos sentidos e a importância do brincar nas sinapses - ligação entre neurônios.

Experiência. Giovanni, de 4 anos, diverte-se com uma máquina de escrever no espaço Mamusca, em São Paulo, onde os pais levam crianças para brincar Foto: Felipe Rau/Estadão

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"Os neurocientistas mostraram que os afetos positivos na interação da criança com o adulto geram sentimentos de segurança e prazer, fatores imprescindíveis para a saúde mental", explica a educadora Adriana Friedmann, em um estudo encomendado pela Bauducco para basear um movimento chamado Amigo ‘KID V!D’, inspirado em um biscoito feito para dividir com o coleguinha.

Pesquisadora do tema, Adriana afirma que a ansiedade excessiva dos adultos acaba deixando em segundo plano as necessidades dos pequenos. "A gente não tem realmente respeitado o ritmo das crianças. Tudo precisa ter equilíbrio."

Alguns pecadilhos são comuns no dia a dia. Por exemplo: quando o pai apressado ou o professor interrompe uma brincadeira abruptamente, desmontando um mundo, uma linguagem que estavam sendo construídos. Ou ainda o adulto que intervém sem necessidade enquanto a criança brinca sozinha, o que é natural entre os mais novos.

"Os pais podem ser bons observadores das ações e interações infantis, sabedores que, ao brincar, a criança está talhando sua visão de mundo", afirma a professora aposentada da Universidade de São Paulo (USP) Zilma Oliveira.

A educadora alerta que, muitas vezes, a escolas também falham. "Nas escolas, predomina a ideia do ensino centrado no professor e as brincadeiras livres costumam ser vistas como lazer, ignorando seu valor na promoção de importantes aprendizagens, ainda que fora do menu pedagógico."

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Para os pais. Coordenadora pedagógica da Escola Stance Dual, de São Paulo, Liliane Gomes conta que é necessário investir no diálogo com os pais para que eles entendam a importância das atividades livres. Na unidade, os alunos costumam ter três momentos ao longo do dia em que ficam livres.

"Principalmente em relação às crianças de 5 anos, os pais ficam muito ansiosos de que eles estejam lendo e escrevendo. Precisamos de reuniões extras para que eles diminuam essa ansiedade", explica Liliane. "Quando elas brincam, aprendem a resolver os problemas. E essa é a meta da vida."

Até mesmo fora do ambiente escolar, a pressão por resultados do brincar é sentida. A pedagoga Paula Kesselman coordena o espaço Mamusca, na zona oeste da capital paulista, onde pais levam seus filhos para brincar. "Tivemos dificuldade no começo porque muitos pais nos perguntavam: 'Eles vão ficar soltos assim?'"

O Mamusca mantém educadores observando ou sugerindo brincadeiras, histórias, além de oficinas - que não têm horário definido. O espaço abriu ainda a Escola de Pais, para aproximar os adultos do livre brincar.

Enquanto era amarrado em uma brincadeira pelo filho Giovanni e pela amiguinha Julie, ambos de 4 anos, o engenheiro João Arantes, de 50 anos, disse que sabia a importância do brincar. "Em casa, a gente faz laboratório de desenho e de massinha. A gente se diverte muito", afirmou o professor universitário. "Quero que ele tenha autonomia para decidir."

* Atualizado às 11h39

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