O centenário Colégio São Luís está de mudança. Desde 1918 na Avenida Paulista, a escola, uma das mais antigas e tradicionais de São Paulo, anuncia para 5 mil pais, professores e funcionários que vai transferir sua sede para a região do Ibirapuera, na zona sul da capital, em 2020. A alteração faz parte de uma renovação na proposta pedagógica do colégio e ocorre na esteira do surgimento de escolas de elite com projetos inovadores na capital paulista.
A nova sede vai ocupar terreno de 15,4 mil metros quadrados na Avenida Dr. Dante Pazzanese, vizinho ao Museu de Arte Contemporânea e ao Instituto Biológico. As obras devem começar em outubro. A Companhia de Jesus não divulgou por quanto o terreno foi comprado nem o novo uso do prédio atual.
O colégio diz esperar que a transferência signifique só uma mudança de sede – e não de público. Segundo Sônia Magalhães, diretora-geral do São Luís, hoje cerca de 70% das famílias matriculadas moram em um raio de até 5 quilômetros da escola. Com a mudança, o porcentual cairia para 54%. “A ideia nunca foi criar um colégio novo, senão uma sede para o São Luís. Esse terreno foi escolhido em detrimento de outros mais baratos que levavam a escola para 20 quilômetros daqui”, diz.
“Estamos fazendo (desde 2015) a capacitação dos professores (para a nova proposta). E aumentaremos o tempo de formação para 5 horas semanais remuneradas em 2020", completa Sônia. No final deste semestre, a escola deve divulgar o aumento de mensalidade para 2020 – hoje, a de um aluno do ensino fundamental custa R$ 2,4 mil.
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A transferência é a aposta para colocar em prática a nova proposta pedagógica da escola, que tem como características a internacionalização e o currículo em tempo integral. “A sede é uma resposta arquitetônica ao projeto pedagógico que está sendo revisto. Nesta sede atual haveria muitos limites”, reconhece Sônia, primeira mulher à frente do Colégio São Luís após uma sucessão de 32 padres.
A mudança só foi comunicada com antecedência a um pequeno grupo de funcionários. Ex-aluno do colégio e atual diretor de ensino médio, Rafael Araújo, de 40 anos, foi um deles. Por dois anos, teve de esconder o segredo da mãe, Nilza, de 66 anos, antiga funcionária, e do filho Miguel, de 9, aluno novato – três gerações que se despedirão do prédio na Paulista.
Araújo vê com otimismo a mudança, embora guarde boas histórias da região atual. “Teve o impeachment do (ex-presidente Fernando) Collor (em 1992) e fomos para as ruas, estávamos no meio dos caras-pintadas. Até o reitor foi com a gente.”
Pai de uma aluna do 8º ano, o engenheiro João Souza, de 45 anos, não gostou da notícia. "Moro em Higienópolis (região central) e a escola fica a 15 minutos de casa. Na Vila Mariana (zona sul), devo levar 40", diz ele. A filha é levada de carro e costuma voltar de ônibus. "Na nova sede, os alunos ficarão 'encastelados'", acrescentou.
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Nova proposta. Em 2020, a escola deverá ter currículo de tempo integral e preparar alunos para universidades no exterior. Neste ano, o colégio deu o pontapé na adoção de métodos diferentes de ensino, como aulas invertidas – em que o aluno é responsável pelo próprio aprendizado e o professor atua como um orientador de estudos – e aprendizagem por projetos.
Essas são formas também propostas por novos colégios, como Avenues e Concept. De portas abertas este ano em São Paulo, estas escolas prometem renovar o ensino na cidade e já “chacoalham” antigos colégios (leia mais abaixo).
Os novos modelos de ensino devem ganhar mais força no espaço do Ibirapuera. Mas, segundo o padre Carlos Alberto Contieri, reitor do colégio, o processo de inovação no São Luís “não é algo extraordinário”. “É parte do modo de ser da Companhia de Jesus, que em cada tempo buscou adaptar-se”, diz.
No novo espaço, as salas serão maiores – 80 m² contra os 50 m² atuais. “E serão organizadas fisicamente por área de conhecimento. Os alunos é que vão trocar de sala”, diz Sônia. O colégio terá espaços multiúso, que poderão servir como laboratórios, salas de robótica ou para atividades de mão na massa.
Se, por um lado, a escola perde proximidade com a Paulista, por outro, ganha em espaços mais verdes e planos. O novo projeto, que prevê apenas três pavimentos, pretende acabar com o sobe e desce de escadas – a sede atual tem sete andares.
Na proposta, assinada pelo escritório de arquitetura Athié Wohnrath, haverá espaço para hortas e composteiras. E a ideia é aproveitar a arborização natural do terreno – são 130 árvores. “Vamos manter o máximo possível do que está lá”, diz Sônia.
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Novas escolas de elite mobilizam as tradicionais
Com a chegada recente de escolas de propostas inovadoras em São Paulo, a diretoria do Colégio Rio Branco, há mais de 70 anos na cidade, se movimentou. “Quando começou esse alvoroço, fizemos um exercício de olhar para nossos projetos e os dessas instituições e identificar atributos que chamavam atenção”, conta a diretora, Esther Carvalho. “Peguei professores brilhantes e discutimos um currículo flexível”, diz.
Movimentações como a do Rio Branco ocorrem após a instalação de colégios como Avenues e Concept em São Paulo. Voltados para a elite paulistana e com mensalidades que podem chegar a R$ 8 mil, eles defendem o protagonismo do aluno, flexibilidade no currículo e internacionalização.
Para colocar o aluno na linha de frente do aprendizado, o Colégio Dante Alighieri, há 107 anos em São Paulo, abriu disciplinas eletivas no ensino médio. Também criou o Middle School, em que estudantes do 7.º e do 8.º ano seguem currículo internacional - o High School, para os maiores, já é oferecido há 9 anos. “Sempre olhamos para fora, para o que está acontecendo no mundo”, diz Silvana Leporace, diretora geral pedagógica.
Para o presidente da Associação Brasileira de Escolas Particulares, Mauro de Salles Aguiar, já é possível sentir os efeitos da novidade em colégios tradicionais. “Se as escolas não repensarem a maneira de trabalhar, seguramente perderão espaço”, diz ele, que também é diretor do Colégio Bandeirantes.
Para Aguiar, são dois os principais desafios: mudança na estrutura física e formação de professores. O risco, diz, é o surgimento de projetos mais preocupados com a forma do prédio do que com o que acontece dentro dele. “Não adianta fazer reforma física sem professores preparados”.
Diretora da Escola da Vila, de proposta construtivista, Sônia Barreira defende que o tipo de formação proposta pelos novos players já é praticada pelo colégio. "São escolas que vão precisar vencer desafios importantes, como transformar em prática pedagógica coletiva um discurso que entrou na moda", diz.