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Amor à pesquisa e compromisso mantêm cientistas na Embrapa

Doutores e especialistas põem a instituição em posição de respeito no cenário mundial, e sofrem assédio constante das empresas privadas

Por Agencia Estado
Atualização:

Num centro de excelência como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), pesquisadores resistem ao assédio da iniciativa privada por amor à pesquisa e reclamam mais da falta de verba para custeio do que dos salários - geralmente inferiores a R$ 5 mil brutos, bem abaixo do que poderiam ganhar fora do serviço público. Rodolfo Rumpf, o coordenador da equipe que produziu a bezerra Vitória, o primeiro clone brasileiro, poderia encontrar facilmente um emprego para receber pelo menos três vezes mais numa empresa privada de biotecnologia, por causa da visibilidade de sua pesquisa. Mas pretende se aposentar na Embrapa: "Decidi me tornar pesquisador à medida que fui vendo o quão pouco se conhece do universo. Claro que aí fora poderia ganhar muito mais mas esse trabalho permite uma série de outras realizações." Rumpf não revela o valor de seu salário, mas é baixo o suficiente para que tenha dificuldade "em dar uma boa escola" para os três filhos. Sem CLT nem estabilidade Além de salários inferiores aos pagos no setor privado, os pesquisadores da Embrapa ainda são contratados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e não gozam da maioria dos privilégios dos servidores comuns, como aposentadoria integral e estabilidade. Por causa dessa disparidade, mais a luta para financiar pesquisas, as empresas se acostumaram a incorporar pesquisadores da Embrapa. "Já embutimos como uma das nossas funções a formação de recursos humanos para a iniciativa privada", diz Rumpf. Mesmo assim, muitos resistem ao assédio do setor privado. "O emprego na iniciativa privada sempre traz muito mais insegurança, mais esforço, porque você não tem muito tempo para pensar", conta o gerente da área de comunicação empresarial da Embrapa em Londrina, Amélio Dall´Agnol. "No setor privado, o pesquisador tem de defender os interesses da empresa, naturalmente. Para um pesquisador de vocação mesmo, é bastante frustrante. Para muita gente é inaceitável, mesmo que o salário seja alto." Salário três vezes maior Agnol conta que, numa das vezes em que foi convidado para o setor privado, considerou a possibilidade, mas só aceitou negociar por um salário três vezes maior. "Pelas vantagens que eu achava que tinha dentro da empresa, de tranqüilidade, de fazer realmente aquilo que minha consciência dita, de poder divulgar os resultados, a satisfação de estar contribuindo com esse crescimento que a gente percebe que está acontecendo no setor", explica. Ele vibra, por exemplo, com os avanços que permitiram ao Brasil disputar o topo do mercado mundial de soja. "Até os anos 60, a soja era uma planta de clima subtropical ou temperado. E o Brasil conseguiu romper essa barreira desenvolvendo tecnologia." Antônio do Nascimento Rosa, pesquisador da Embrapa em Campo Grande (MS), ganha cerca de R$ 4.700, apesar do doutorado e dos 28 anos trabalhados na empresa. "Sinto-me muito feliz, muito realizado", diz. "Nessa área de seleção (de raças para melhoramento animal), tive o privilégio de fazer parte de um programa que ajudou a construir esse monumento que é a pecuária nacional. É gratificante a gente saber que um pouquinho do nosso suor, um pouquinho do nosso fosfato está aí junto." Reconhecimento sem orçamento Em vez de reclamar dos salários, os pesquisadores acusam o governo de investir cada vez menos na Embrapa, apesar de seu crescente sucesso na pesquisa de ponta na agropecuária, alcançado em grande parte com as parcerias que a estatal desenvolve com o setor privado. "O que muitas vezes nos deixa tristes e de certa forma desapontados é que todo mundo reconhece a Embrapa, a contribuição que ela deu", diz Rosa. "Volta e meia a gente vê elogios na imprensa, na televisão, mas infelizmente, ano após ano, o que se tem verificado é a diminuição de contrapartidas do governo federal no orçamento da Embrapa." Mas nem o corte de verbas federais, que correspondem a apenas cerca de 30% dos gastos da equipe da Vitória, por exemplo desanima totalmente os pesquisadores. "Confio nessa filosofia que o governo novo está implementando, de valorizar o social, de combate à fome, de aumento da produção de alimentos, bem como de aumento de divisas da exportação", afirma Rosa. "No Brasil, um país de vocação agrária, a gente espera que agora a Embrapa venha a receber o valor que ela de fato merece."

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