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Adolescentes que usam drogas: o papel da família e da escola

Valores do mundo em que vivemos são os maiores responsáveis pelo consumo de entorpecentes

Por Rosely Sayão
Atualização:

Ana – nome fictício – é divorciada e tem dois filhos adolescentes: um casal. Eles têm um contato distante com o pai, que mudou de Estado e, por isso, os encontros presenciais são raros, principalmente agora com a pandemia. Porém, conversam remotamente toda semana.

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Ana passou a trabalhar em casa e, poucos meses após o início da quarentena, entrou em depressão. Passou a tomar medicamento e pensa em fazer terapia assim que se sentir mais à vontade para ir regularmente ao consultório.

Os filhos nunca deram muito trabalho a ela: costumam levar a vida estudantil sempre na média, e tinham o costume de frequentar festas em casa de amigos, todos conhecidos da mãe. Na última semana, ao arrumar o quarto do menino, encontrou um vaso com uma planta que considerou estranha. Foi pesquisar na internet e descobriu que é de maconha. Correu ao quarto da filha e não tinha vaso, mas lá encontrou um cigarro pela metade da erva.

Chamou os filhos para conversar e ouviu uma frase que outras mães já ouviram também: "Qual o problema de fumar de vez em quando? Você não toma remédio todos os dias? Qual a diferença?". Foi aí que ela entrou em contato comigo, ao perceber que não conseguira bons argumentos para explicar as diferenças aos filhos e convencê-los de que deveriam parar de fumar. 

Muitos adolescentes usam drogas, lícitas e ilícitas. Por quê? Não existe um motivo que possa ser universalizado: cada um deles usa por seus motivos, que são pessoais. Alguns por lazer e em busca de prazer, outros para passar mais rapidamente por momentos difíceis; há os que usam por não saberem outra maneira que os leve a pertencer a um grupo, outros por pura rebeldia ou busca de novas e instigantes sensações. E há os que usam apenas porque há a oferta. Afinal, vivemos no tempo do consumo, não é verdade? 

Rosely Sayão é psicóloga e colunista do 'Estadão' Foto: Valeria Gonçalves/ Estadão

Já consideramos que uma família desorganizada, desestruturada, disfuncional, ausente, seja lá o que tudo isso signifique, era a maior responsável pelo uso e abuso de drogas por seus filhos. Hoje, os valores do mundo em que vivemos é que são os maiores responsáveis pelo uso e abuso de drogas, e não só por adolescentes. Afinal, a vontade de passar rapidamente por momentos difíceis ou desagradáveis e a busca permanente de satisfação e prazer são apelos fortes em nossa sociedade.

Bem, mas compreender não é desculpa para deixar os jovens usarem as drogas quando e como quiserem, certo? O que podemos fazer? Primeiramente, vamos falar da responsabilidade das escolas. Quase todas elas, ao descobrirem uso de drogas por alunos em seu espaço, costumam tomar uma medida que considero simplista: expulsar o aluno envolvido na questão, em vez de encarar a complexidade da questão. Opa! Mas não é missão da escola educar o cidadão? Em vez de expulsar, não seria bem mais educativo abordar o tema à luz do conhecimento existente?

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E as famílias? Estas, podem e devem sempre cultivar as qualidades e virtudes em seus filhos e, principalmente, ensinar e praticar o amor à vida. Aliás, característica que anda em falta na formação dos mais novos. Mas, como transmitir amor à vida? 

Isso não se faz em um dia, em um ano, em uma década. É durante todo o processo educativo, que vai do nascimento à conquista da autonomia. Os pais devem praticar regularmente essa atitude de respeito à vida – própria, do outro e de todos os seres vivos – e dar significado a essas atitudes. Não basta, por exemplo, pregar a sustentabilidade do meio ambiente para os filhos: é preciso agir de modo coerente e simbolizar as atitudes, nomeá-las. Cuidado, respeito, amorosidade consigo mesmo e com o outro são palavras-chave desses ensinamentos. 

*É PSICÓLOGA, CONSULTORA EDUCACIONAL E AUTORA DO LIVRO EDUCAÇÃO SEM BLÁ-BLÁ-BLÁ

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