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A formação do adolescente aprendiz

Por Agencia Estado
Atualização:

Rubens Naves * A recente renúncia dos representantes da sociedade civil no Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), órgão que assegura a execução da política de atendimento a crianças e adolescentes no Município de São Paulo, encerra algumas lições. Uma delas, o quanto é difícil a construção de uma prática democrática, que exige objetividade, desprendimento e compromisso com a prioridade às crianças e aos adolescentes. O CMDCA é um órgão criado por determinação do Estatuto da Criança e do Adolescente com a função de formular uma política pública municipal de atendimento à criança e ao adolescente. Mas nem sempre o Poder Executivo lhe concede a legitimidade ou o aparelhamento técnico e financeiro necessário a seu funcionamento, embora seja obrigado a fazê-lo. Muitos conselhos nem sequer dispõem de computador. Uma publicação editada pelo Instituto Telemig Celular em parceria com a Fundação Abrinq dá os passos mais importantes a serem seguidos para que um CMDCA tenha eficácia e bom desempenho. ?Os dois grupos de conselheiros (governo e sociedade civil) têm a responsabilidade de construir uma Política Municipal de Proteção Integral para Crianças e Adolescentes, tarefa que requer debates, priorizações, deliberações, construção de consensos, decisões majoritárias, tudo isso guiado pelo interesse superior da criança e do adolescente? (a publicação encontra-se no site da Fundação Abrinq, www.fundabrinq.org.br). Diz ainda a publicação que ?o conselheiro que representa o governo deve oferecer aos representantes da sociedade civil todas as informações necessárias para a melhor deliberação e o correto controle das ações: diagnósticos, planos, projetos, gestão administrativa, financeira e orçamentária da administração pública municipal?. Quanto à sociedade civil, recomenda-se que, ?além de oferecer aos conselheiros que representam o governo todas as informações levantadas pelas organizações sociais, deve manter com essas organizações um intercâmbio constante e transparente de informações. Ele está a serviço da comunidade e deve mantê-la informada?. Com a renúncia coletiva, os representantes da sociedade civil no CMDCA de São Paulo reverberaram algumas dificuldades que vêm encontrando no relacionamento com o poder municipal. Dentre elas, destaca-se a enfrentada por organizações que têm programas voltados à aplicação da Lei do Aprendiz. Esta lei, que obriga grandes e médias empresas a terem entre 5% e 15% de seus funcionários contratados na condição de aprendizes, estendeu às organizações não-governamentais (além do Sistema S, tais como Sesi, Senai e Senac, e das escolas técnicas) a possibilidade de formarem esses adolescentes. Porém, até esta semana, dentre mais de 30 projetos apresentados pelas organizações da sociedade civil, somente um foi aprovado. Não questionamos os complicadores do processo (como, por exemplo, entidades que tiveram seus registros cassados); porém há organizações que desenvolvem o trabalho com seriedade. Sabendo-se que a lei pode beneficiar até 2 milhões de adolescentes no País, a morosidade do CMDCA em dar andamento aos processos dificulta a formação desses jovens. Empunhar a bandeira do adolescente aprendiz é vantajoso para o poder público, que pode enfrentar a questão do desemprego sem inchar seus quadros e comprometer a responsabilidade fiscal. E, para as empresas, ter aprendizes em seus quadros talvez seja a melhor ação de responsabilidade social que se possa fazer, pois promove a inclusão de adolescentes nascidos em famílias de baixa renda, além de representar um investimento no futuro trabalhador. A experiência de muitas empresas, como a da Volkswagen, mostra que muitos dos aprendizes são efetivados após a experiência. Ao CMDCA de São Paulo, uma vez recomposto e superada a atual crise, fica a idéia de um Plano Municipal de Aprendizagem, mobilizando as organizações sociais para elaboração de projetos e as empresas para a responsabilidade social. A sociedade brasileira está empenhada em abrir oportunidades aos adolescentes. Impedir-lhes oportunidades de aprendizado por ineficácia de um órgão que deveria atender ao interesse do adolescente representa uma inadmissível inversão de prioridades. Nossos jovens precisam de emprego, em especial o primeiro, para se romper o ciclo perverso da exigência de experiência anterior, que breca a possibilidade de ingresso no mercado de trabalho dos que nunca tiveram a oportunidade inicial. É um direito que lhes cabe e governo e sociedade civil têm o dever de atender. * Diretor-presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente - contato: www.fundabrinq.org.br

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