A escola ideal de Cristovam Buarque

A Arquitetura, por exemplo, tem de se preocupar com casas populares; a Nutrição tem de se preocupar com a fome e não apenas em emagrecer rico gordo.

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Por Agencia Estado
Atualização:

As avaliações - marca da política educacional brasileira nos últimos anos - devem mesmo aparecer de cara nova no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Além do Provão, o ministro da Educação, Cristovam Buarque, diz que pode reformular também o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em vez de uma prova só no último ano, como ocorre desde 1998, três avaliações no fim de cada uma das séries do antigo colegial. A mudança se enquadra no que o ministro chama de escola ideal. Em entrevista ao Estado., ele conta como imagina esse novo modelo de educação. Engenheiro civil e doutor em economia pela Universidade de Sorbonne, Cristovam também não está contente com o ensino superior no País. A pedido de Lula, quer aproximar o que se aprende nas universidades brasileiras das "necessidades do povo". Estado - O senhor tem dito que é preciso criar a escola ideal. Como é esse modelo? Cristovam Buarque - Estamos concluindo 20 itens para constituir essa escola ideal. O primeiro deles diz que ela é a escola onde todas as crianças estão. Se tiver criança fora da escola, naquele Estado, a escola não é ideal. É também onde os professores são motivados. Para isso tem de ter um programa de valorização dos professores. É a escola que alfabetiza os adultos, bem equipada, cujo prédio é bonito e limpo. Ela também não é chata e consegue incutir na criança os problemas da contemporaneidade, ecologia, ética. Essa escola tem de ter um método pedagógico que não caia na aprovação automática, mas que não freie as crianças. Em Brasília (durante o seu governo), a criança que perdia uma disciplina passava de ano, mas ficava devendo essa disciplina. Na verdade, ela não passava de ano, mas acompanhava sua turma, seus colegas da mesma idade. Se reprime, ela acaba se desmotivando com os colegas mais novos. Mas se permite a progressão livre, ela não estuda. Estado - Mas, para isso, será necessário conversar com os secretários nos Estados e municípios. Cristovam - A idéia é fazer isso onde o governador quiser e o prefeito quiser. Não será uma imposição do governo federal, até porque eles vão ter de colocar recursos deles. Por exemplo, para ter toda criança na escola vai precisar de um Bolsa-Escola melhor. Estado - O senhor sempre achou baixo o valor de R$ 15 do Bolsa-Escola. Como aumentá-lo? Cristovam - Em cooperação com prefeitos e governadores e, na medida do possível, com as demais áreas do governo federal. Eu vou primeiro procurar recursos dentro, se não encontrar é que vou procurar fora do MEC. E também vou procurar no exterior, na sociedade civil. Vamos trabalhar cidade por cidade, Estado por Estado, não o Brasil inteiro. O valor do Bolsa-Escola pode ser diferente em cada cidade. Estado - Como vai ficar o Enem na sua gestão? Cristovam - A idéia do Enem é positiva, inclusive para o aluno. Ele pode mostrar no seu currículo a nota que tira, usá-la para ingressar na universidade. Mas a gente quer que o Enem seja feito através dos três anos do ensino médio para que o aluno estude ao longo dos três anos. Quando a gente faz o Enem só no último ano, ele só estuda nesse ano. Essa idéia está dentro da linha do que implantei em Brasília, o Programa de Avaliação Seriada (PAS), que é o instrumento de ingresso hoje na UNB para metade dos alunos (o vestibular é feito no fim de cada ano do ensino médio). Mas, vamos manter o Enem, mesmo que seja com esses ´enenzinhos´. Estado - Para que o Enem e o Provão ocorram este ano é necessário fazer as licitações este mês. Então, quando serão feitas as mudanças? Cristovam - Elas só ocorrerão no ano seguinte. Os livros escolares, por exemplo, já estão encaminhados até 2004. Voltando ao Provão e ao Enem, a gente não quer parar uma avaliação para fazer outra. Queremos que o Provão seja obrigatório, mas pode não ser para todos os alunos, os técnicos ainda vão estudar isso. Mas, só vai mudar quando tiver pronto o próximo, para não criar descontinuidade. Estado - O senhor diz que quer deixar uma marca na universidade. Que marca é essa? Cristovam - O presidente Lula quer deixar sua marca na universidade porque ele tem a sensibilidade para o fato de que ela não está em sintonia com a velocidade com que o conhecimento científico e tecnológico avançam hoje. O Lula quer também uma universidade comprometida com a solução do problema da exclusão social, que perceba as necessidades do povo na hora de ensinar seus alunos. É preciso adaptar os currículos. A Arquitetura, por exemplo, tem de se preocupar com casas populares; a Nutrição tem de se preocupar com a fome e não apenas em emagrecer rico gordo. Estado - O senhor já escolheu o novo Secretário de Ensino Superior (Sesu)? Cristovam - Não escolhi ninguém ainda para Capes nem para a Sesu, que é o cargo mais difícil, porque dele depende o futuro do ministério. A pessoa precisa ter três qualidades: liderança intelectual para liderar aqueles que vão elaborar um projeto novo de universidade, ser criativo para enfrentar a falta de recursos e hábil para evitar conflitos que possam fazer naufragar o ministério.

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