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Os primeiros passos promissores da BNCC nos estados e municípios

"A BNCC não resolve sozinha todos os desafios da Educação Básica, mas sua implementação pode ajudar a gerar mudanças capazes de ampliar a aprendizagem e assegurar o desenvolvimento pleno dos estudantes. O processo precisa seguir - e seguir com qualidade", afirmam Anna Penido e Katia Stocco Smole, integrantes do Movimento pela Base Nacional

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Por Todos Pela Educação
 

Anna Penido e Katia Stocco Smole*

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No início de maio, a rede estadual de Educação de São Paulo anunciou o Inova Educação, um programa voltado para as escolas do 6º ano do Ensino Fundamental ao Ensino Médio que tem como pilar o desenvolvimento integral dos seus mais de 2 milhões de estudantes. Crianças e jovens terão a oportunidade de pensar em seus projetos de vida e escolher disciplinas eletivas conforme seus interesses e aptidões. Trata-se de uma proposta com potencial de dar mais sentido ao que os estudantes aprendem, criando a conexão que falta entre a escola e a vida no século XXI.

O programa paulista foi construído a partir de experiências que já acontecem na rede e de uma pesquisa feita com alunos e professores. Mas, sobretudo, ele traz o espírito da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o referencial nacional que estabelece as aprendizagens essenciais para os alunos da Educação Básica. Trata-se de um bom exemplo de como as discussões e revisões curriculares provocadas pela implementação da BNCC podem gerar mudanças relevantes para o desenvolvimento integral dos alunos, dando autonomia a redes e escolas para seguirem seus próprios projetos pedagógicos, sem padronizações. E existem outros casos semelhantes emergindo pelo País. 

Aprovada em 2017, para as etapas de Educação Infantil e Ensino Fundamental, e em 2018, para o Ensino Médio, a BNCC tem como finalidade promover a educação integral dos estudantes, prevendo o desenvolvimento de competências e habilidades que os preparem para a vida. Entre elas, pensamento crítico, criatividade, comunicação, colaboração, argumentação e capacidade de se organizar, seguir seus objetivos e tomar decisões com ética, autonomia e responsabilidade.

Desde o ano passado, estados e municípios trabalham em regime de colaboração para incorporar as competências da BNCC em seus currículos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. O esforço mobiliza educadores e gestores em torno do que é preciso aprender na escola, gerando discussões, planejamentos e criações de programas e currículos diversos e plurais, numa movimentação considerada inédita na história da Educação brasileira.

O processo de construção coletiva tem se mostrado uma ferramenta fundamental para garantir que as especificidades dos estudantes de cada território sejam atendidas

Vinte e uma unidades da federação revisaram seus currículos à luz da BNCC e já tiveram seus documentos aprovados pelos conselhos estaduais de educação. Outras seis aguardam aprovação. De acordo com números fornecidos pelas redes, mais de 4.800 municípios aderiram ao regime de colaboração e cerca de 3.600 participaram ativamente das consultas públicas online realizadas para a construção dos novos currículos no ano passado.

O processo de construção coletiva tem se mostrado uma ferramenta fundamental para garantir que as especificidades dos estudantes de cada território sejam atendidas. O Mato Grosso do Sul, por exemplo, estado que faz divisa com a Bolívia e o Paraguai, incluiu em seu referencial curricular a língua espanhola desde o primeiro ano do Ensino Fundamental. Trata-se de uma questão não apenas geográfica, mas cultural, especialmente para os alunos e famílias que vivem próximos às fronteiras. O currículo de Mato Grosso do Sul, construído com adesão de 100% dos municípios, tem como marca a diversidade e contempla estudantes quilombolas, indígenas, ribeirinhos, de assentamentos, entre outros.

Em Roraima, onde 62% das escolas são indígenas, foram coletadas contribuições para o novo currículo em aldeias de oito etnias. Na rede municipal da capital do estado, Boa Vista, a construção do currículo para a etapa da Educação Infantil, referenciado na BNCC, baseou-se em evidências científicas das aprendizagens que bebês e crianças pequenas devem apresentar nessa fase e a partir de oficinas realizadas com diretores de escolas, professores e famílias.

Na mesma linha, a secretaria municipal de Ribeirão Pires (SP) montou um grupo de estudos sobre a BNCC, composto por pais, professores, gestores escolares e representantes do conselho municipal de educação e sindicatos. Ali, discutem sua visão sobre a criança, como se desenvolve na escola, como considerar suas experiências e qual o papel do professor nesse desenvolvimento. Desse grupo sairá a primeira versão do inédito currículo de Educação Infantil do município, que seguirá para as mais de 31 unidades de unidades escolares que trabalham com essa etapa de ensino, onde os mais de 700 professores da rede serão consultados.

A BNCC começa também a movimentar outras frentes, como formação de professores em serviço e materiais didáticos. A secretaria estadual de educação do Paraná ouviu 22 mil estudantes e 10 mil professores para conhecer sua opinião sobre os livros que utilizam e suas expectativas em relação ao que os materiais deveriam conter. De forma geral, os estudantes apontaram, por exemplo, que os livros atuais não estimulam o uso de tecnologia e não trazem realidades locais. Tanto estudantes quanto docentes gostariam de receber materiais que estimulem competências e habilidades. O resultado da pesquisa, entre outros critérios, ajudará na produção e seleção de materiais didáticos da rede.

Essas e tantas outras iniciativas são oportunidades trazidas pela BNCC para que os estudantes brasileiros tenham clareza de seu direito a uma formação de qualidade e significativa. A BNCC não resolve sozinha todos os desafios da Educação Básica no Brasil, mas sua implementação pode ajudar a gerar mudanças capazes de ampliar a aprendizagem e assegurar o desenvolvimento pleno dos estudantes. Para tanto, é preciso investir em formação de professores e promover o alinhamento dos materiais didáticos e das avaliações  - como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

Ainda necessitamos trilhar um longo caminho para que o potencial de transformação dessas e de tantas outras propostas se concretize. Por isso, o processo de implementação da BNCC precisa seguir - e seguir com qualidade. Este ano, os professores da Educação Infantil e Ensino Fundamental começam a ser formados em alinhamento com os novos currículos. Da mesma forma, as escolas começam a rever seus projetos pedagógicos. No Ensino Médio, o movimento atual é para a construção das arquiteturas curriculares, que levarão em conta a BNCC, além de outras diretrizes trazidas pelo Novo Ensino Médio. Mas os desdobramentos até agora são promissores, e precisam continuar assim.

*Integrantes do Movimento pela Base Nacional Comum