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Alegria: fundamento da didática e princípio pedagógico essencial

Nestes tempos excepcionais em que fomos obrigados a verdadeiras pirotecnias didáticas para compensar o distanciamento físico, dediquei-me à reflexão sobre tudo o que pratiquei, aprendi e observei na difícil e mutável arte de ensinar. Todos nós começamos emulando aqueles que nos seduziram e levaram à profissão, mestres exemplares que marcaram nosso estilo. Seminários e leituras foram buscados pelo receio do anacronismo; abrimos mão, muitas vezes, de práticas consolidadas para retornar a elas buscando encontrar o melhor caminho nesse emaranhado de obstáculos e situações inusitadas.

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Por Colégio FAAP
Atualização:

Prof. Henrique Vailati Neto - diretor do Colégio FAAP ( Foto: Fernando Silveira)

Enfim, ensinar sempre será um gigantesco e muito delicado trabalho artesanal, cuja mutabilidade e fragilidade da matéria-prima nos obrigam à máxima atenção sob pena de "estragá-la para sempre". Quantos seres humanos foram desestimulados (ou mesmo castrados) para certas áreas do conhecimento pela incompetência pedagógica de um professor?

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Conseguindo colocar de lado todo um vasto ferramental de meios que iam do bem falar aos mais avançados recursos de TI, consegui chegar a um dos princípios essenciais e universais da pedagogia: a alegria no ensinar e no aprender, a criação da verdadeira atmosfera para a construção do saber pelo aluno.

Em um artigo, li uma frase lapidar de Nelson Rodrigues: "Se a tristeza deixa marcas profundas a alegria, muito mais". Os momentos alegres, diferentemente dos tristes, buscamos conservar como patrimônios de nossas memórias e, quando neles está inserido o conhecimento, obtemos a fórmula ideal para ensinar e aprender

Lembro, com bastante dissabor, uma entrevista feita com o diretor de uma escola onde o indigitado personagem afirmava que "seus professores não eram palhaços e que risadas não tinham espaço em seu colégio". Certamente, tentava justificar a sisudez árida de uma escola, como muitas outras, que se queria "séria", "puxada", diferentemente "daquelas outras risonhas e francas". Era a essência de uma cultura retrógrada e contraproducente que acreditava que pessoas sérias deveriam ter siso, que a  alegria era coisa de irresponsáveis, que a linguagem da autoridade deveria ser de monossilábicos grunhidos, secundados por raros esgares de aprovação e que os "dentes do poder" não deveriam ser mostrados em sorrisos, quanto mais em risadas.

Terrível equívoco, provavelmente, provocado pela "ameaça da cultura dos cursinhos", cuja orientação didática (deixemos a pedagogia distante) obrigava seus professores a verdadeiros malabarismos histriônicos para manter enormes plateias atentas nas maratonas dos vestibulares. A "maldição da escola risonha e franca", algo altamente desejável, criou usinas de terror pedagógico que lograram produzir alguns sobreviventes exitosos, mas geraram legiões de recalcados.

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Se a pedagogia se realiza numa cultura de cordialidade, a alegria é sua decorrência natural e desejável. Da mesma forma que a cordialidade espontânea é um dos fundamentos essenciais da autoridade, a alegria (que em nada ameaça a disciplina) é o coroamento de estruturas organizacionais saudáveis e proativas. Na rudeza do mercado, na aspereza da iniciação científica, ambientes leves predispõem ao enfrentamento dos desafios, facilitam o engajamento em ações coletivas como o mundo atual exige e a vida agradece.

Sei que não é simples, no cotidiano das aulas, manter esse clima de cordialidade e alegria sempre presente. A tarefa essencial nasce no desenho de um projeto educacional que contemple (na sua essência, em todos os momentos e lugares de sua existência), a construção de uma cultura cordial consciente e coerente que mostrará os seus frutos no perfil de seus alunos. Não surgirá de ações isoladas fortuitas e, dessa forma, se estabelecerá como um princípio que, naturalmente, contaminará toda a instituição.

                                                                                                                                                                               

 

Professor Henrique Vailati Neto é diretor do Colégio FAAP - SP. Formado em História e Pedagogia, com mestrado em Administração. É professor universitário nas disciplinas de Sociologia e Ciência Política. Tem quatro filhos e quatro netos.

 

Troque ideia com o professor: col.diretoria@faap.br

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