Ana Maria Diniz
24 de novembro de 2016 | 13h07
A rigor, a globalização começou quando os primeiros humanos deixaram a África em busca de uma vida melhor em outros continentes, mas foi somente na metade do século passado que o fenômeno ganhou velocidade. A era dos aviões a jato, nos anos 50, foi o início de uma aproximação inédita de povos e culturas. A partir daí, com os avanços tecnológicos que se seguiram, as distâncias encolheram drasticamente, mudando por completo a nossa forma de viver e de se relacionar.
Como disse o jornalista americano Thomas Friedman, o mundo ficou plano.
Hoje, 3,2 bilhões de pessoas, cerca de 40% da população da Terra, usam a internet, segundo a União Internacional de Telecomunicações. Todos os dias, elas conversam, trocam informações e interagem por meio de 500 milhões de tweets, 1 bilhão de posts no Facebook e de 600 milhões de sites, entre outras ações. Essa interação ainda vai aumentar. Em 2025, a maioria da população mundial terá passado, numa só geração, da ausência de qualquer acesso à informação não filtrada ao acesso a toda e qualquer informação, diz Eric Schmidt, presidente da Alphabet, holding do Google, no livro A Nova Era Digital.
Enfim, as barreiras que conhecíamos há trinta anos, territoriais, econômicas ou culturais, praticamente não existem mais: os fluxos migratórios são constantes, mercadorias circulam com facilidade e a informação chega a qualquer lugar, em volume e velocidade impressionantes.
A globalização está sob fortes questionamentos, não há dúvidas. Como identificou a revista The Economist na sua edição de 30 de julho, o mundo não se divide mais entre esquerda e direita, mas entre aberto e fechado, entre os que acreditam num mundo global e integrado e os que apoiam o protecionismo. Mas a interação mundial chegou a um ponto sem retorno, irreversível.
Nosso futuro é inevitavelmente comum, como bem disse Gro Brundtland, ex-primeira-ministra da Noruega e criadora do conceito de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável. Pensar numa sociedade integrada, interdependente, com disparidades sociais gigantescas e oriunda de culturas e histórias tão díspares, não é trivial. Esta é mais uma dimensão para a qual temos de preparar e educar nossos jovens. Aliás, talvez seja a dimensão humana mais importante de ser trabalhada daqui para a frente.
É nosso dever formar cidadãos globais, com a consciência de que precisamos pensar e agir de forma responsável sobre os recursos naturais do planeta, pois eles são finitos, de forma a respeitar e compartilhar a nossa humanidade como sociedade que tem interesse no bem comum e também em promover o progresso e gerar riqueza para todos.
Nos Estados Unidos e em muitos países da Europa, a formação de estudantes globalmente competentes já faz parte do currículo escolar. Mas o Brasil ainda não começou a fazer sua lição de casa, com algumas pontuais exceções. A boa notícia é que não é necessário mudar todo o sistema de ensino para se ensinar cidadania global. É possível introduzir conceitos em qualquer sala de aula do planeta.
Eis algumas ideias de como fazer isso:
Ensine os alunos a valorizar e a respeitar as diferenças, sejam elas étnicas, religiosas ou culturais. Use as diferenças para discutir valores diversos. Conte a história dos direitos humanos e o que isso representou em termos de avanços para a sociedade. Em contrapartida, fale sobre os principais conflitos em curso e o que os motiva.
Use números e estatísticas para fazer com que os estudantes parem e pensem sobre o mundo em que vivem. Conte aos alunos, por exemplo, que 1 em 8 pessoas no mundo passa fome ou que 30% dos países estão em guerra. Neste momento, é interessante fazer comparações entre diferentes realidades, mostrando o número de mortos no conflito da Síria e no tráfico de drogas no Brasil.
Use as notícias para fomentar a discussão sobre assuntos relevantes. Compare os efeitos do fenômeno El Niño no clima dos Estados Unidos e do Brasil ou promova o debate sobre a recente eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, e a relação disso com as turbulências políticas pelas quais o Brasil está passando.
Fale sobre povos e culturas de diferentes cantos do mundo. Mostre que é possível fazer amizade com meninos e meninas do outro lado do planeta. Aprender sobre hábitos, necessidades, desejos, inquietações e sonhos de crianças e jovens de vários cantos do globo pode ser muito rico e um caminho para se tornar um verdadeiro cidadão global.
Muitas outras coisas podem ser feitas nesse sentido. O importante é dar o primeiro passo!
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