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Como a Geografia pode ensinar a ler e a escrever?

Num artigo dedicado à importância do ato de ler, Paulo Freire diz: "a leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto". 1

Por Colégio Albert Sabin
Atualização:

Esse excerto se refere ao método de alfabetização criado por Paulo Freire em que o indivíduo deve aprender a ler e escrever a partir do contexto que ele vivencia e não com base num contexto externo à sua realidade. Dessa maneira, podemos dizer que o contexto a ser lido pode ser o da relação com o cotidiano, com base nos conhecimentos prévios de cada indivíduo.

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Ocorre que a instituição escolar cumpre um papel fundamental de, cotidianamente, colocar os indivíduos diante de reflexões, situações e vivências que seriam impossíveis caso ficassem restritos apenas às vivências no núcleo familiar.

A escola, por meio das abordagens específicas das diferentes disciplinas, trabalha no sentido de ampliar a possibilidade de leitura dos contextos. À medida que o indivíduo aprimora a leitura do mundo, amplia seu rol de conhecimentos e expande, portanto, sua capacidade de compreender outros fenômenos ainda mais abstratos. Assim, torna-se capaz de ler diferentes aspectos da realidade, uma vez que essa realidade se apresenta cada vez mais complexa.

 Foto: Estadão

Esse é o movimento citado por Freire, em que "linguagem e realidade se prendem dinamicamente", uma vez que a primeira leitura de mundo se transforma em discurso por meio da apropriação da linguagem escrita. Na medida em que o discurso se aprimora, o sujeito utiliza-se dos conceitos, tornando-se visíveis outros aspectos da realidade que, por sua vez, possibilitam outras leituras.

A leitura da realidade passa a ser feita com base nos conceitos científicos de qualquer ciência, e, para que possa fazer essa leitura, esse indivíduo deve ter sido alfabetizado cientificamente. Deve, portanto, dominar um rol de conceitos específicos dessa ou daquela ciência, mas, principalmente, saber aplicar os conceitos. Essa habilidade de articular os conceitos pode ser entendida como o "método" de cada área do conhecimento.

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Pode-se fazer uma analogia com o conceito de sintaxe utilizado na Linguística, uma vez que o método científico de cada área específica da ciência corresponde à ordenação lógica de uma dada ciência. A sintaxe pode ser entendida como a ordenação lógica do pensamento que dá sentido à linguagem. Nesse sentido, cada disciplina científica tem seu próprio método, da mesma maneira que cada língua tem sua própria sintaxe.

O método de cada ciência é o que dá sua especificidade, ou seja, o que garante sua contribuição na compreensão de um determinado aspecto da realidade. No caso da leitura geográfica, por exemplo, o indivíduo deve dominar as categorias e os conceitos centrais da Geografia e, principalmente, a sua "sintaxe", ou seja, dominar a ordenação lógica do sentido e do significado da localização dos fenômenos.

Tornar o aluno capaz de articular tais conceitos, a fim de produzir uma leitura e um discurso do mundo que o cerca, é alfabetizá-lo na linguagem da ciência geográfica e, portanto, torná-lo alfabetizado geograficamente.

Gostaria de finalizar essas considerações, chamando a atenção para a importância das atividades de Estudo de Meio e demais propostas de trabalho interdisciplinar. No caso dos Estudos de Meio, as relações sociais inerentes aos lugares visitados, as paisagens e os contextos das diferentes realidades às quais os alunos são expostos devem ser, antes de tudo, vivenciadas, mas também colocadas como textos a serem lidos e interpretados, e não simplesmente ilustrações que confirmem os conteúdos que foram propostos previamente em sala de aula.

 Foto: Estadão

Essa é a perspectiva que nós, no Colégio Albert Sabin, adotamos para a realização das atividades de Estudo do Meio no Ensino Médio. Por meio de temas relativos aos diversos olhares de cada disciplina, os alunos elaboram perguntas de pesquisa, selecionam bibliografia e coletam dados em campo para a produção de pesquisas relativas aos lugares selecionados. Ou seja, por meio dessa e de outras atividades, optamos pelo caminho da alfabetização dos estudantes para a produção de pesquisas científicas, a fim de que possam ler e escrever cientificamente sobre os fenômenos humanos e naturais que nos cercam e dos quais somos participantes.

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[1] FREIRE, P. A importância do ato de ler em três artigos que se completam. 42. ed.São Paulo: Editora Cortez, 1992.

Augusto Monteiro Ozório

Professor de Geografia.

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