SÃO PAULO - Curta-metragens, documentários e técnicas de cinema têm sido usados por colégios particulares de São Paulo para atrair alunos às disciplinas tradicionais. A estratégia é unir História, Geografia, Português, Redação e até Ciências em projetos audiovisuais que levem os estudantes do ensino fundamental a usar o que viram nos livros na prática.
Embora nem sempre o objetivo seja torná-los jovens cineastas, a lição é completa: assistem aos clássicos, aprendem a fazer roteiros, entrevistas, filmagem e até edição. No Colégio Santo Américo, no Jardim Colombo, na zona oeste de São Paulo, o 9.º ano do ensino fundamental realiza um projeto anual obrigatório que unifica as disciplinas em um documentário que tem por objetivo discutir os problemas da cidade de São Paulo.
Os alunos, divididos em grupos de até oito pessoas, precisam escolher um tema polêmico e atual – neste ano, por exemplo, estão trabalhando com o fechamento do Elevado Costa e Silva (Minhocão), a discussão sobre a criação do Parque Augusta, ambos na região central, o lazer da juventude e a diversidade.
A fusão de disciplinas tem início logo na discussão do tema. “Em Geografia e História, eles têm o trabalho de levantar as discussões sobre a cidade, a origem dos problemas”, explicou o coordenador pedagógico do ensino fundamental 2 do Santo Américo, José Ruy Lozano. Português e Redação são os responsáveis por dar forma ao trabalho. “É nessas disciplinas que eles vão ter o trabalho de elaboração do roteiro, escolher que tese vão defender em relação ao problema.”
Para introduzir os estudantes à linguagem audiovisual, são exibidos diversos documentários ao longo do ano. A filmagem é feita com equipamentos dos próprios alunos, seja com câmeras digitais ou até smartphones. Já a parte de edição é feita em um estúdio do colégio.
A vantagem, explica Lozano, é a transversalidade do trabalho. “Trabalhar com cinema é trabalhar com as múltiplas inteligências. Aprende não só o aluno que gosta de pesquisa, mas o que prefere a escrita, a linguagem audiovisual”, disse. A nota do documentário compõe uma das avaliações das disciplinas envolvidas, além de realização das provas comuns. “Estamos diante de um problema concreto, não só de algo teórico. O aluno percebe o problema que o aflige na cidade, não só de maneira abstrata.”
Fusão de conteúdos. Para incentivar os estudantes a criar conexões práticas entre os conteúdos das disciplinas, o Colégio Bandeirantes, na zona sul, também implementou, em 2013, seu projeto de cinema. Em um ano, são produzidos dois curta-metragens que duram cerca de 10 minutos cada, totalmente produzidos por alunos do 9.º ano. É feito um por semestre: no primeiro, o tema é livre, para que os alunos se habituem à produção.
No segundo, o desafio é maior, há temas definidos e precisam conectar fatos históricos e produção científica. “Eles precisam analisar um tema da época que estão estudando em História, como a 2.ª Guerra Mundial, e ligar aos inventos dos cientistas que estudaram nas aulas de Ciências”, explicou o professor de Artes do Bandeirantes, Pedro Cardoso Leão.
A avaliação do trabalho é feita separadamente. “Em Artes, analisamos figurino, filmagem e edição; nas outras, o conteúdo. O aluno pode ir mal em uma parte e bem na outra”, explicou Leão. Apesar de a proposta ser focada nas disciplinas, o professor destaca que os estudantes começam a tomar gosto pelo cinema. Ao longo do ano, eles têm contato com quatro obras: Tempos Modernos (Charlie Chaplin); 2001, Uma Odisseia No Espaço (Stanley Kubrick); Sonhos (Akira Kurasawa) e Romeu e Julieta (Franco Zeffirelli). “Explicamos a eles que existe uma diferença de linguagem entre esses filmes e o que os alunos assistem hoje, com cenas mais rápidas e curtas.”
Acesso ao mundo.O contato mais próximo com a cidade e com a produção dos trabalhos fez os alunos terem mais interesse em assistir às aulas. “Conseguimos ter mais acesso ao mundo real, não ficamos fechados só na matéria”, comentou a estudante do Santo Américo Mariana Cordeiro, de 14 anos. O documentário da aluna, ainda em produção, vai abordar a violência em festas e baladas de jovens na capital. “É uma realidade que está próxima da gente”, disse.