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Estudo aponta 'reorganização velada' no Estado de São Paulo

165 escolas públicas deixaram de abrir turmas de início de ciclo de ensino; 53 delas estavam na lista do projeto de restruturação

Por Isabela Palhares e Luiz Fernando Toledo
Atualização:

SÃO PAULO - Em 2016, 165 escolas da rede estadual de São Paulo deixaram de abrir turmas de início de ciclo de ensino, ou seja, de 1ºe 6º anos do ensino fundamental e 1º ano do ensino médio, as "séries de entrada". Entre essas unidades, 53 eram apresentadas no ano passado pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB) como escolas que fariam parte da reorganização escolar (seriam fechadas ou teriam o fechamento de ao menos um ciclo de ensino). O levantamento foi feito pela Rede Escola Pública e Universidade, com base em informações obtidas pela Lei de Acesso à Informação.

"Um número muito grande de escolas estava nas listas da reorganização escolar que o governo queria fazer no ano passado. A reorganização, que não ocorreu no ano passado por causa dos protestos estudantis, está sendo feita de forma velada e com impactos para a médio e longo prazo, porque estão fechando gradualmente os ciclos", disse Salomão Ximenes, professor de Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC (UFABC) e um dos responsáveis pelo estudo.

Estudantes comemoram suspensão da reorganização da rede estadual pelo governo Alckmin Foto: GABRIELA BILO / ESTADAO

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Procurada, a Secretaria Estadual da Educação declarou nesta terça-feira, 28, em nota, que é "absurda a tese de que há reorganização velada". "Em avaliação prévia, a Secretaria da Educação detectou que o estudo apresentado pela ONG Ação Educativa (com 165 supostas escolas, ou seja, 3% das cerca de 5 mil escolas estaduais) apresenta inconsistências graves. Das supostas escolas apontadas pela análise, por exemplo, 17 pertencem à Fundação Casa e, portanto, não são escolas", informou.

A secretaria também informou que entre as 165 escolas apontadas há 15 unidades que se tornaram de tempo integral e 8 tiveram seus 1º anos do ensino fundamental assumido pelas prefeituras. 

No ano passado, a secretaria foi alvo de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público e a Defensoria Pública contra a proposta de reorganização escolar, que previa o fechamento de 94 colégios e a transformação de 754 unidades em ciclo único, com a transferência de 311 mil alunos. 

A medida foi suspensa pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) no dia 4 de dezembro, após quase 200 escolas estaduais terem sido ocupadas e uma pesquisa do Datafolha apontar queda de popularidade do político. Em dezembro, o Tribunal de Justiça decidiu por revogar todos os efeitos da reforma na rede estadual.

"Com o fechamento das turmas em anos iniciais, a Secretaria Estadual de Educação estaria iniciando a reorganização e, portanto, descumprindo a ordem judicial", disse Salomão.

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Entre as escolas que tiveram o fechamento de turmas iniciais neste ano, 40 apareciam na lista das 754 que seriam reorganizadas.

Além disso, a maior parte das turmas iniciais fechadas nas escolas são as de ensino fundamental. Ao todo, 46 escolas deixaram de ter o 1º ano do ensino fundamental 1 e 84 unidades não tiveram turmas de 6º ano do ensino fundamental 2.

"O que reforça um dos argumentos que apresentamos no ano passado sobre a motivação do governo para a reorganização: a municipalização forçada do ensino fundamental. Sem negociação ou pactuação com os municípios diretamente afetados, o Estado está fechando turmas nessa etapa", ressaltou Ximenes.

A Secretaria Estadual da Educação (SEE) disse que a análise ignora que desde fevereiro deste ano já foram abertas 656 salas novas salas e que, atualmente, "a rede dispõe de 613.000 carteiras vazias em suas escolas e que podem ser ocupadas imediatamente". "A abertura de classes está ligada à demanda de cada unidade", argumentou.

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Queda de alunos. O estudo também mostrou que a rede estadual teve uma queda de apenas 1.336 matrículas de 2015 para 2016 no ensino básico regular - a rede tem mais de 4 milhões de alunos em todo o Estado. Uma das justificativas do governo Alckmin para a reorganização era a redução do número de matrículas, por causa da queda de crianças e jovens em idade escolar, a municipalização do ensino fundamental e a migração para a rede privada.

Apesar da queda de apenas 1.336 alunos nos ensinos fundamental e médio, segundo o estudo, de maio de 2015 para maio de 2016, houve uma redução de 2.404 turmas na rede estadual. Sendo que 1.954 das turmas fechadas eram de ensino fundamental e 450 do ensino médio. 

"Essa queda de matrículas não é representativa, é muito pequena e não justifica o total de turmas fechadas no Estado. Temos quase duas turmas fechadas para cada aluno a menos na rede estadual", disse Ximenes. 

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O ensino médio foi o único dos três ciclos de ensino que teve aumento de matrículas em 2016 - com 38,3 mil alunos a mais. Ainda assim, teve o fechamento de 450 turmasescolas estaduais. 

Em nota, a SEE informou que "não existe fechamento de classes, todas as turmas são abertas conforme a demanda de alunos". Informou ainda que os dados de abril mostram que houve uma redução de 107 mil alunos na rede e uma queda de 1.395 salas em todo o Estado. No entanto, a secretaria não informou porque baseou a resposta nos dados de abril ao invés de utilizar o dado mais atual de maio, que foi enviado para os pesquisadores da Rede.

Estudo. O levantamento foi feito após uma análise da resposta dada pela Secretaria Estadual de Educação à ação civil pública. Os pesquisadores consideraram a resposta insuficiente, por isso, solicitaram e obtiveram os dados do cadastro de todas as escolas estaduais por turmas, etapa e turno, relativos aos meses de maio de 2015 e maio de 2016, pela Lei de Acesso à Informação.

A Rede, responsável pelo estudo, é formada por um grupo de professores e pesquisadores das universidades do Estado (Universidade Estadual de Campinas, Universidade de São Paulo, Universidade Federal de São Paulo, Universidade Federal de São Carlos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo e UFABC). O grupo foi constituído em fevereiro de 2016 motivado pela reorganização escolar e os movimentos de resistência à sua implementação.