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Atualidades na Fuvest: Os 50 anos da renúncia de Jânio Quadros

Maior fenômeno eleitoral da história do Brasil, Jânio buscou superar impasse com o Congresso

Por Rose Saconi , Lizbeth Batista , de O Estado de S. Paulo e e Cedê Silva
Atualização:

O que faz um fato se tornar histórico? A renúncia de qualquer governante sempre será. Mas poucas teriam efeitos tão imediatos e tão duradouros quanto a ocorrida há 50  anos numa Brasília ainda cheirando à tinta fresca. Alegando que “forças terríveis” o impediam de governar, o presidente Jânio Quadros anunciou na manhã do dia 25 de agosto de 1961 sua decisão de renunciar ao cargo de sucessor de Juscelino Kubitschek.

 

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Jânio permaneceu apenas sete meses no governo. O que para muitos era para ser mais um blefe do político da ‘vassoura’, ficou conhecido como um dos atos mais misteriosos do cenário nacional. O próprio Jânio jamais apresentou detalhadamente sua versão. “Peguem qualquer uma das 18 versões e escolham a sua”, dizia ele.

 

Naquele dia, Jânio participou primeiro da comemoração ao Dia do Soldado e defendeu em discurso sua política externa. Após a solenidade, deixou com o ministro da Justiça a carta de renúncia, com ordem para que a levasse ao Congresso apenas às 3 horas da tarde (provavelmente porque nesse horário não haveria mais quórum suficiente para deliberar sobre a renúncia). Em seguida, arrumou as malas e deixou Brasília, já como ex-presidente.

 

O Congresso, porém, aceitou sua decisão de imediato e nomeou Ranieri Mazzili presidente interino. A ação abriu caminho para uma série de acontecimentos políticos que resultou no golpe militar de 64.

 

Para o historiador Felipe Loureiro, doutorando na USP, Jânio sintetiza o populismo: era uma força política separada do partido e se identificava com o cidadão comum. As plataformas do político que fez da vassoura seu símbolo eram o combate à corrupção e o controle dos gastos públicos.

 

“O vestibulando deve prestar atenção também na herança econômica que Jânio recebeu de JK, de inflação e dívida externa crescentes”, ressalta Loureiro. “Logo no começo do governo, ele teve que ser muito conservador fiscalmente. Liberou o câmbio, para desvalorizar o cruzeiro e com isso incentivar as exportações. Limitou o crédito para empresários, cortou gastos e aumentou alguns impostos.” As repercussões dessas medidas foram sentidas por João Goulart e até pelos militares.

 

Mas talvez o aspecto mais crucial do curto governo de Quadros seja a política externa, diz Loureiro. Jânio inaugurou a chamada “política externa independente”, reatando relações diplomáticas com países comunistas, como a China e a União Soviética. Gaspar Dutra tinha uma política de alinhamento automático com os Estados Unidos, e JK, se menos radical, ainda era bastante próximo aos americanos. Durante o conturbado contexto da Guerra Fria e da revolução em Cuba, é Quadros quem inicia para o Brasil uma postura mais assertiva.

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Quanto à renúncia, se não há quem tenha a explicação definitiva, há motivações. “A Constituição de 1946, vigente na época, não tinha o instrumento das medidas provisórias, como a nossa de 1988. Então, se o relacionamento do presidente com o Congresso fosse difícil, poderia haver paralisia decisória”, explica Loureiro. “A renúncia foi uma tentativa de Jânio superar o impasse entre Executivo e Legislativo e conseguir poderes extraordinários para governar.”

 

Alguns setores das Forças Armadas não queriam que o vice Goulart tomasse posse. “Poderia ter havido uma guerra civil”, diz Loureiro. “Mas Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul, era cunhado de Jango e tinha influência sobre o Exército na sua região, que, por estar na fronteira, tem um contingente numeroso”. Brizola adotou a posição legalista, apoiando a posse do vice eleito pelo povo. Ou quase. “Como os analfabetos não podiam votar, isso favorecia quem morava nas cidades, na época minoria no Brasil.”

 

Jânio Quadros foi o maior fenômeno eleitoral da nossa história. Vereador, deputado estadual, prefeito, governador, deputado federal – afora o Senado, ele galgou todos os cargos eletivos existentes.  Nada por nomeação.  De professor secundário a presidente da República, sua ascensão política demandou apenas 13 anos. Subiu a rampa do Planalto aos 44 anos de idade e saiu pela garagem, por vontade própria, antes de completar 45.

 

Jânio tomou posse no dia 31 de janeiro de 1961 e sua administração foi marcada por medidas moralizadoras. Proibiu a briga de galo, lança-perfume em bailes de carnaval e até biquínis em concursos de miss.  Tinha o hábito de se comunicar com ministros por meio de memorandos, os famosos “bilhetinhos de Jânio”.

 

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