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Alunos do Direito-USP fazem mapa ideológico

Características que foram dadas a calouros vão de ‘bolsominion’ a ‘maconheiro de esquerda’

Por Luiz Fernando Toledo
Atualização:

SÃO PAULO - Integrantes do Centro Acadêmico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no Largo de São Francisco, fizeram uma lista dos calouros da instituição, separando-os por seus interesses políticos, gostos musicais e até religião. O documento interno, uma planilha no Google, vazou e causou repúdio dentro da faculdade. 

Planilha com dados de Facebook indignou estudantes e professores Foto: NILTON FUKUDA/ESTAD?O

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Os dados, obtidos a partir das “curtidas” que cada estudante tem em seu Facebook, seriam usados para mapear novos alunos com interesses políticos semelhantes ao do grupo que hoje ocupa o Centro Acadêmico e, assim, trazê-los para a organização. 

A lista, feita por integrantes do Coletivo Contraponto, com membros ligados à juventude do Partido dos Trabalhadores (PT), traz o nome do estudante, uma indicação sobre sua origem (de qual cidade veio e onde estudou), um “mapa de likes” (analisando quais páginas o estudante curte no Facebook para tentar identificar sua orientação política), um link para a página pessoal do calouro na rede social e também o “responsável” no centro acadêmico em fazer o contato com o calouro, para tentar atraí-lo para o grupo.

Entre as características apontadas estavam “velhão”, “progressista”, “judeu”,”crente”, “bolsominion” (apoiador do candidato Jair Bolsonaro), “maconheiro de esquerda”, “ideologia desconhecida, judia”, “liberal de merda” e até “não tem Facebook, maluca total”. Quando a lista vazou em um grupo dos estudantes, diversos alunos manifestaram repúdio nas redes sociais. O texto de um deles, Vitor Fuks, foi compartilhado até por um docente. “Rotular as pessoas sistematicamente de acordo com crença, gostos pessoais e amizades para futura captação política beira o fascismo.” Um professor de Direito da unidade, Ari Marcelo Solon, que compartilhou o texto, ironizou. “Judeu crente de esquerda que posta a favor do Lula apoia Fuks.”

Críticas. “Há evidentemente uma manifestação de preconceito e de abuso de poder. Estão usando uma instituição que é pública, dos alunos, para atingir fins políticos particulares”, disse, em entrevista ao Estado, um ex-presidente do Centro Acadêmico do 11, o advogado Renato Stetner. Em um grupo fechado de alunos também houve dezenas de críticas.“Isso é sintomático de uma política distante da disputa de consciência e pautada na abordagem individual personalista. E isso nunca vai ser uma vergonha pra vocês, mas para o movimento estudantil de esquerda deste lugar que acaba tendo de se ver representado assim”, postou um deles. 

O presidente do 11, Luís Fernando Gonçalves, disse ao Estado que o coletivo pede desculpas pela forma como o documento foi exposto, mas defendeu o documento. “Como movimento estudantil, uma das tarefas centrais é de conseguir fazer com que outras pessoas entrem nessa engrenagem. Por meio desse mapa, buscamos identificar em qual espectro ideológico o aluno se identifica mais.” Ele reconheceu que parte dos membros do coletivo é ligada ao PT, mas disse que há diferentes correntes na gestão. 

Em nota oficial, o diretor da Faculdade de Direito, Floriano de Azevedo Marques Neto, disse que “rejeita veementemente qualquer tipo de preconceito, segregação, intolerância ou classificação desabonadora a membros da comunidade ou em detrimento de quem for”.

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Coletivo pede desculpas e admite 'postura inaceitável'

Em nota divulgada publicamente, o Coletivo Contraponto pediu “as mais sinceras desculpas” a todos e todas que se sentiram ofendidos com as descrições colocadas na tabela. "Entendemos o constrangimento de ter uma descrição associada ao seu nome em uma tabela a que nem mesmo se tem acesso, bem como repudiamos a presença de termos ofensivos no nosso mapa, e por isso reiteramos, mais uma vez, nossas mais sinceras desculpas", diz o texto do grupo. O coletivo reconheceu que os comentários “despolitizados”, feitos por eles, “são de extrema gravidade por reforçar estereótipos e preconceitos, sendo uma postura inaceitável para um grupo político de esquerda".

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