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Novas regras do Fies podem punir estudantes mais pobres

O incentivo ao esforço e a busca de bons resultados são sadios, assim como não financiar estudantes para instituições de ensino superior sem qualificação

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Por Roberto Lobo
Atualização:

Novas regras do Fies podem punir estudantes mais pobres

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Roberto Lobo  27 de janeiro de 2015

O governo federal apresentou recentemente as novas regras para o Financiamento Estudantil (Fies). Algumas medidas são inegavelmente corretas, como a proibição de acumulações de Fies e bolsa do ProUni, ou outro Fies em mais de uma instituição. Ninguém pode ir contra essas decisões.

A questão mais polêmica é o item que trata dos critérios de desempenho acadêmico mínimo para os candidatos ao financiamento. São exigidos agora pelo menos 450 pontos no Enem e a exigência do estudante ter realizado o exame de 2010 em diante.

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Ministro da Educação Cid Gomes defendeu medidas de controle do Fies. ED FERREIRA/ ESTADÃO Foto: Estadão

Essa segunda exigência pune pessoas que não tiveram a oportunidade de ingressar em uma faculdade ao se formarem no ensino médio e não fizeram o Enem, uma vez que o exame não era utilizado com esse objetivo. Deveria entrar em vigor dentro de, ao menos, um ano de sua publicação para permitir que pessoas nessa situação se preparassem para o exame.

A primeira exigência, no entanto, é mais complexa. Embora em uma primeira análise ela se apresente como uma defesa da orientação de investimentos pela qualidade e pelo estímulo ao melhor desempenho dos estudantes, princípio que é defendido por todos os especialistas, na verdade a medida poderá, neste caso, punir os estudantes economicamente menos favorecidos que cursaram, por necessidade, escolas públicas que em sua maioria tem menor nível de qualidade. É só observar, por exemplo, que entre as cem escolas com melhores médias no Enem, 96 são privadas e somente quatro são públicas!

Como o ensino médio do setor público brasileiro em geral está abaixo da crítica, parece muito questionável excluir estudantes que desejem prosseguir seus estudos enquanto pouco se faz para efetivamente melhorar nossas escolas básicas, onde reside verdadeiramente o cerne do problema da nossa educação.

A argumentação apresentada é, neste momento, quase um sofisma. Punindo os estudantes mais carentes em nome da preservação da uma qualidade que inexiste em nosso ensino público de nível médio. O Fies, muito mais que um processo seletivo, deveria ser, enquanto não tivermos igualdade de oportunidades na educação, um financiamento para ajudar justamente os que mais precisam!

Estudantes sem recursos financeiros e mal formados poderão continuar a ingressar em faculdades sem qualidade (que, afinal, não foram fechadas pelo MEC). Só que agora terão que pagar seus estudos ou disputar o ProUni - e provavelmente trabalhar mais e estudar menos.

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No entanto, há uma parte de lógica no argumento do governo. O incentivo ao esforço e a busca de bons resultados são sadios, assim como não financiar estudantes para instituições de ensino superior (IES) sem qualificação.

A má qualidade das IES que continuam oferecendo cursos não é problema dos estudantes e, sim, do sistema de acreditação a cargo do próprio MEC. Os prejudicados, nesse caso, serão o lado mais fraco. 

Enquanto isso, o governo renova os planos ambiciosos de aumentar o número de universitários no Brasil. Talvez fosse uma boa medida o governo repensar esse projeto buscando dar mais coerência entre as medidas propostas, a realidade e os macro objetivos da educação brasileira.

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