1) Como e por que você começou a MadCode?
Daniel Cleffi: A escola surgiu de uma discussão entre amigos sobre a educação de nossos filhos. Buscávamos algo que pudesse complementar a educação formal tradicional, que desenvolvesse a forma deles pensarem. Iniciamos uma pesquisa ao redor do mundo, visitamos projetos na Europa e nos Estados Unidos e entendemos que o ensino de programação não era mais opcional. Ficou claro que nos tempos atuais qualquer criança precisa ser alfabetizada digitalmente. Percebemos que a programação é hoje o que foi o inglês para a nossa geração. O ensino de uma segunda língua era um diferencial que se tornou obrigatório e o mesmo acontecerá com a programação.
2) Numa sociedade dependente das tecnologias, é sensato inferir que os jovens que saibam programar terão vantagem sobre aqueles que não. Quais países estão integrando o ensino da programação no currículo educacional público?Daniel Cleffi: Aqueles que aprenderem a programar certamente se diferenciarão dos demais. Hoje os que sabem programar já possuem uma vantagem sobre os outros. Muito em breve, os que não sabem programar estarão em prejuízo frente à maioria, que terá essa capacidade. Recentemente o próprio Barack Obama disse que "na nova economia aprender a programar não é opcional". Vivemos em um mundo eminentemente digital, entender como a tecnologia funciona transforma os consumidores em produtores de inovação. Permite que um médico use a tecnologia a favor da cura, que um advogado use a tecnologia a favor da justiça e assim por diante.
A Inglaterra tornou o ensino de programação para crianças uma disciplina curricular. A Estônia, há mais de uma década, investiu em um programa de transformação da educação através da tecnologia e também colocou programação como curricular. No ano passado a Austrália também anunciou que programação deverá ser curricular. Há também uma preocupação econômica por parte destas nações. A demanda por profissionais técnicos aumenta exponencialmente no mundo todo, mas a procura dos jovens por carreiras relacionadas a tecnologia não sobe na mesma proporção. O Brasil teve o déficit de 40 mil profissionais de TI (Tecnologia da Informação) em 2014, e as projeções são que em 2020 este número possa passar de 400 mil. Incentivar o domínio da tecnologia desde cedo pode ser um dos caminhos para este ajuste.
3) Há poucas semanas publiquei um post sobre "a utilidade da inutilidade". A programação é um conhecimento técnico, aparentemente voltado ao utilitarismo extremo. Qual aplicabilidade não-técnica a programação dá ao jovem que a domina?Daniel Cleffi: Steve Jobs já dizia que "todos deveriam aprender a programar, pois programar ensina a pensar". Quem aprende a programar desenvolve habilidades como raciocínio lógico, pensamento crítico, capacidade de resolver problemas complexos e capacidade de trabalhar em equipe.
Em 2015 foi divulgado um estudo pelo World Economic Forum em colaboração com a Boston Consulting Group que discorre justamente sobre este assunto. O estudo faz o mapeamento das habilidades que serão fundamentais para o profissional do século 21. A pesquisa apontou que apenas 6% dos adultos demonstraram um alto nível de proficiência na habilidade de solucionar problemas em contextos intensos em tecnologia. Trata-se da capacidade de usar a tecnologia para resolver problemas e realizar tarefas complexas. Trata-se de capacidades cognitivas exigidas numa época em que o manuseio da informação se faz fundamental.
4) Como está o Brasil frente a outras economias da América Latina no ensino da programação para crianças e jovens?Daniel Cleffi: O ensino de programação para crianças existe há décadas no Brasil. Eu mesmo aprendi a programar quando era criança. Entretanto, vivemos um blackout nos últimos 20 anos, quando a programação deu lugar ao aprendizado de ferramentas de escritório como o Windows e Office. Neste meio tempo o mundo mudou, a Internet chegou e o poder computacional foi para a palma das mãos. Este novo ambiente reinventou o ensino de programação para crianças, fez surgir novas ferramentas e uma disciplina adaptada às novas possibilidades, a possibilidade de fazer aplicativos que resolvam os seus problemas específicos (mas potencialmente também o de milhares de outras pessoas).
Neste novo contexto o Brasil e a América Latina ainda têm poucas iniciativas e infelizmente me parecem longe de fazer como a Inglaterra. Continuaremos a ter alguns poucos exemplos de sucesso, como o inventor do Instagram, que é brasileiro. Infelizmente casos como este continuarão sendo raros enquanto o país não promover esta disciplina como essencial e obrigatória.
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